quinta-feira, 11 de fevereiro de 2021

HAVANA - SONHO OU PESADELO ? - PARTE 3

PARTE 3


 

DIA 5

A programação do dia foi iniciada com a visita ao Gran Teatro, o mais importante do país, e que já foi palco das pouquíssimas apresentações de estrelas da música internacionais que já se apresentaram em Cuba, dentre os quais a banda Simply Red, que possui um lindo DVD gravado no local, intitulado simplesmente “Cuba”. O teatro realmente é belíssimo e bem cuidado. É um dos poucos prédios públicos que apresenta condições de visitação adequadas ao turismo de padrão internacional.


Gran Teatro


Em seguida fui ao Museu Nacional de Belas Artes, que basicamente possui obras contra os EUA, União Europeia, o capitalismo, entre outros “inimigos”. Muita ideologia e pouca arte disponível.

A Casa de la Obra Pia, atração seguinte, é uma das poucas residências da época do período espanhol que se encontra restaurada, preservada e pintada. Não é possível visitá-la por dentro, mas o pátio interior é muito bonito.

Catedral de Havana


As próximas paradas foram o Museu de Arte Colonial e a Catedral de Havana, ambos situados na mesma praça. O museu fica dentro de um belo casarão antigo, mas sua coleção não possui grandes atrativos. Já a catedral é muito interessante e imponente, sendo a maior existente no país. Foi um pouco estranho ver um templo católico tão grande em um país comunista, cuja ideologia nega a existência de Deus. No entanto, o povo cubano parece divergir bastante da ideologia dos dirigentes do país, pois as igrejas são bastante frequentadas pela população. Apesar de tudo, ainda há uma forte presença do catolicismo na sociedade cubana.

Plaza Vieja


Próxima parada: Plaza Vieja, a Praça Velha”, a qual se encontra muito bem restaurada e pintada. Eu até presenciei um ensaio fotográfico com uma linda modelo que, provavelmente, estava sendo fotografada para alguma revista de moda internacional.

CDR


Um dos maiores sinais da opressão que o povo cubano sofre de seu governo ditatorial foi a existência dos CDR (Comitês de Defesa da Revolução), existentes em todas as partes da cidade e do país. Basicamente, se trata de centros nos quais há cidadãos que, em nome do governo, controlam os demais integrantes do CDR. Denunciam seus vizinhos, parentes e amigos que exerçam qualquer atividade ou tenham opiniões divergentes das oficiais provenientes do governo. Desta forma, se você fizer críticas ao governo, escrever algo, participar de algum protesto ou apenas criticar, pode ter certeza de que um dos seus vizinhos lhe entregará ao governo. Outra instituição que possui papel semelhante é a UJC (União dos Jovens Comunistas), cujo lema é “Estudo, Trabalho e Fuzil (sim, você leu corretamente!)” e que exerce essencialmente o mesmo papel dos CDR, só que atua majoritariamente em meio aos jovens do país. Imagine só quantos cidadãos já desapareceram nas prisões cubanas, apenas por se oporem à opressão a que são submetidos diariamente há décadas. Essa é apenas uma das verdadeiras facetas sombrias de uma ditadura que, infelizmente, no Brasil muitas pessoas ainda defendem e se negam a acreditar que existe.

UJC


Uma surpresa que tive ao caminhar pelas ruas do centro foi encontrar uma loja da rede brasileira “Via Uno”. Fiquei pensando quem é que deveria comprar tais calçados, já que a população cubana não tem recursos nem para comprar os artigos produzidos localmente, quanto mais os importados. Talvez sejam os turistas estrangeiros que movimentem tal comércio.

Loja da Via Uno


Fiz um bom almoço no restaurante El Templete, no qual comi um bom filé com batatas e pimentas negras.

A parada seguinte foi o Castillo de San Salvador de la Punta, um importante forte histórico de pedra, repleto de canhões antigos, o qual era usado para proteger a cidade de Havana de ataques dos piratas. O calor que enfrentei foi inacreditável. Pensei que fosse ter uma insolação a qualquer momento, mesmo estando de boné, óculos escuros e coberto por uma espessa camada de protetor solar.

Castillo de San Salvador de la Punta


Outra coisa que me chamou a atenção é a grande quantidade de pessoas que ficam pedindo carona aos motoristas que circulam em automóveis dos anos 50 ou 60, os únicos ainda disponíveis no país. Isso ocorre pelo fato de os transportes públicos no país serem péssimos e extremamente precários. O intervalo entre cada ônibus que passa é enorme e o estado em que se encontram é lamentável. Muitos dos ônibus ainda circulantes no país são aqueles de cor amarela, que aparecem nos filmes americanos dos anos 50, que eram usados para levar as crianças para a escola. Realmente lamentável.

Ônibus dos anos 1950


Fiz um passeio por uma antiga avenida muito arborizada, chamada Paseo del Prado que, nos tempos pré-revolucionários, era um local onde residiam as famílias mais ricas de Havana. Hoje em dia, parece uma sequência de espeluncas, prestes a ruir a qualquer instante.

Paseo del Prado


Para finalizar o dia, tive uma experiência peculiar: fui à um dos poucos restaurantes particulares do país, já que tudo em Cuba pertence ao Estado, e seus cidadãos não têm direito algum a qualquer propriedade privada. No entanto, nos últimos anos, o governo cubano vem cedendo “permissões” para que alguns cidadãos criem restaurantes em suas residências, chamados “Paladares”. Eu fui ao mais famoso, chamado “La Cocina de Lillian”. A casa é isolada em um bairro muito distante e escuro. Não sei como consegui chegar até lá e encontrar tal paladar. Bebi um saboroso Mojito, comi um “Filé com Congris”, que é basicamente uma carne com arroz e feijão misturados. Sem dúvida, uma experiência única.

La Cocina de Lilian


 

DIA 6

Uma coisa que me entristeceu em Cuba foi ver o abandono total em que se encontra o país, seu povo e suas construções. Há outdoors em toda parte. No entanto, não são de anúncios de produtos ou serviços. Apenas propaganda governamental, pura lavagem cerebral ideológica da pior espécie. Para quem é estrangeiro, além de ser revoltante, é patético. Um dos outdoors que eu vi que se encaixou perfeitamente na categoria “patética” foi um que mostrava o perfil de 3 líderes da Revolução Socialista com os seguintes dizeres: “Protagonistas de nosso tempo”. O detalhe é que os 3 líderes morreram há décadas. Como poderiam então ser protagonistas de nosso tempo? Isso é uma pequena amostra do que a ditadura cubana é capaz.

Protagonistas de nosso tempo


Além disso, é um perigo se andar pelas ruas, pois a quantidade de buracos nas calçadas e nas ruas é avassaladora. É muito comum as pessoas caírem dentro dos buracos profundos. O perigo é especialmente acentuado à noite, pois praticamente não há iluminação pública e os buracos se tornam ainda mais difíceis de serem notados. Um perigo à nossa espreita a cada rua.



As casas nas ruas, a maioria em escombros ou a ponto de poderem cair a qualquer momento, são outro perigo constante. É muito comum pedaços dos prédios e casas caírem enquanto os pedestres circulam pelas ruas. Esse é mais um dos motivos pelo qual há tantos atropelamentos no país. Como as calçadas são absolutamente esburacadas e os prédios estão prestes a desmoronar, as pessoas andam pelo meio da rua, pois acham que estão mais seguras. No entanto, se esquecem que também há muitos buracos nas ruas que, junto com a falta de iluminação, torna os pedestres praticamente invisíveis à noite para os motoristas de veículos que circulam por Havana e pelo restante do país.



Para aqueles que acharem que eu estou exagerando, ou sendo duro demais com Cuba, eu recomendo que assistam o documentário “Cuba e o Cameraman”, disponível na Netflix. Esse documentário foi filmado por um americano apaixonado por Cuba e que visitou o país durante 5 décadas. Assistam o documentário e tirem suas próprias conclusões se eu exagerei em meu relato de viagem.



Voltando ao roteiro turístico, este foi o dia mais quente que passei em Cuba: 42 graus Celsius. Um calor inacreditável, com um sol que, literalmente, queimava a pele, por mais protetor solar que eu aplicasse, nada era suficiente para suportar a ardência do sol.

Iniciei o passeio pelo Castillo del Morro, um belíssimo castelo construído em 1589 exatamente na entrada da baía de Havana, com a finalidade de defender a cidade de ataques inimigos e dos piratas. O local é muito amplo, permitindo longas caminhadas para conhecer as várias partes do castelo, suas torres e a maravilhosa vista do mar azul caribenho.

Castillo del Morro


O castelo foi usado na guerra entre a Inglaterra e Espanha, em 1762, quando as tropas britânicas desembarcaram em Cojimar, próximo à Havana, e foram a pé até o castelo, o qual conseguiram dominar. Quando os ingleses devolveram a ilha à Espanha em 1763, foi construída a Fortaleza La Cabaña, bem ao lado do castelo, para evitar que tal situação se repetisse.



O poeta cubano Reinaldo Arenas ficou preso durante um longo período dentro do castelo simplesmente por fazer críticas ao governo castrista, denotando o caráter altamente opressor da ditadura cubana.



Até hoje, pontualmente às 21 horas, há uma salva de tiros de canhão no castelo. Tal tradição vem desde os tempos coloniais, pois era esse o horário em que era sinalizado que os portões da cidade se fechavam.



A Fortaleza San Carlos de La Cabaña fica ao lado do Castillo del Morro. É um lugar muito bonito, bem preservado e interessante. A vista do mar é linda. Nele, podemos ver alguns mísseis soviéticos que estão ali desde a grande crise dos mísseis ocorrida em 1962, quando quase ocorreu uma guerra nuclear entre os EUA e a União Soviética justamente por esta ter instalado mísseis de grande poder destrutivo em Cuba. Os maiores e mais perigosos mísseis foram retirados pelos soviéticos.

Mísseis Soviéticos


Asa de avião dos EUA abatido


Dentro da fortaleza, há dois outros locais muito importantes, mas nem por isso menos assustadores. O primeiro deles é o gabinete de trabalho de Che Guevara, conhecido como “Comandancia del Che”. Foi desse local de onde o sanguinário líder argentino ordenou o fuzilamento de 1892 pessoas, entre eles escritores, poetas e cineastas independentes de Cuba, sem qualquer tipo de julgamento ou auxílio de advogados, pois ele afirmava para quem quisesse ouvir que ele não precisava de provas para executar um homem, apenas saber que é necessário executá-lo. Simplesmente pelo fato de considera-los inimigos. No entanto, tal número se torna pequeno perto das mais de 14.000 execuções por fuzilamento que ocorreram em Cuba apenas até o final da década de 1960. Imaginem quantos mais foram fuzilados desde então? A visita a tal gabinete é realmente muito perturbadora.

Fortaleza La Cabaña


Comandancia del Che


Eu já sabia que o terrível e famoso “El Paredón”, onde milhares de pessoas foram fuziladas por ordem de Che Guevara e Fidel Castro ficava dentro da fortaleza de La Cabaña. No entanto, não há qualquer informação sobre a localização de tal ponto na documentação turística local. Além disso, se perguntamos a qualquer guia ou funcionário público sobre tal “Paredón”, eles dizem que isso não existe ou que não sabem onde fica. Como a fortaleza estava bastante vazia quando eu estava por lá, e não havia câmeras de vídeo ou praticamente nenhum guarda ou vigia, eu decidi procurar por conta própria até encontrar o maldito “Paredón”. Depois de algum tempo, consegui achá-lo, descendo uma escadaria longa de pedra, até a base da fortaleza. Me deparei com um antigo portão de madeira entreaberto. Eu o empurrei e me encontrei cara a cara com o “Paredón”. Fiquei horrorizado e todo arrepiado ao vê-lo. Lá estava o local onde milhares de pessoas inocentes perderam suas vidas. As marcas de balas de fuzil estão em toda parte, lembranças de tanto sofrimento que ocorreu ali. Uma visita das mais tristes que já fiz em minha vida, da qual eu nunca me esquecerei.



El Paredón


Para tentar me recuperar e animar, depois de ver tanta tristeza e sofrimento ainda presentes na fortaleza La Cabaña, fui a Cojimar, próxima a Havana, onde há um pequeno bar chamado “La Terraza”, que fica literalmente em cima do mar. É um local muito tradicional, que era frequentado por Ernest Hemingway, que adorava pescar da janela do bar, pois os peixes já se encontravam no mar logo embaixo do bar. Bebi uma cerveja local, chamada Cristal, e assisti um show de música cubana ao vivo que foi muito bonito e alegre, no qual fui convidado a tocar um pouco de percussão, obviamente em troca de alguns dólares.

La Terraza


Almocei no restaurante El Mercure, onde comi carne com fritas, já que é altamente arriscado de comer qualquer tipo de fruta ou salada em Cuba, tendo em vista que são lavados com a água local, sem qualquer tipo de tratamento. Há incontáveis casos de turistas, muitos deles brasileiros, que se aventuram a beber bebidas com gelo, comer saladas ou frutas e depois passam por dias de diarreias terríveis. Em Cuba só se pode comer pratos assados, fritos, cozidos ou que tenham sido levados ao forno ou fogão. Comer algo cru ou lavado com a água local deve ser evitado a qualquer custo.



Depois do almoço, prossegui no meu passeio para a Finca La Vigia, antiga residência de Hemingway em Havana. Trata-se de um lugar lindo, afastado do burburinho da cidade, no qual o grande escritor tinha sua lancha guardada, seu gabinete de estudos e trabalho, aposentos e até mesmo um pequeno cemitério de animais. Tudo muito bem cuidado e preservado, pois o grande autor era considerado um amigo de Fidel e de Cuba.


Finca La Vigia


Após a visita a Finca La Vigia, fui conhecer a famosa Sorveteria Coppelia, que já protagonizou várias cenas em filmes cubanos, por ser considerado um lugar lendário no país. Ao chegar lá pude entender como “funciona” a sorveteria. Há duas filas separadas, uma para os estrangeiros, que pagam um preço 100 vezes mais caro pelo sorvete, e outra para os cubanos, que pagam míseros centavos pelo mesmo sorvete. A questão mais surpreendente é que a fila para os cubanos conseguirem comprar sorvete dura mais de 5 horas de espera ao sol escaldante de mais de 40 graus! Nunca vi nada igual. Parecia que todo o povo cubano estava na fila. Eu peguei a fila dos estrangeiros, na qual fui atendido imediatamente, paguei em moeda conversível, e saí para o pátio para tomar o pior sorvete de toda a minha vida. É inacreditável que o sofrido povo cubano passe 5 horas de seu dia na fila para conseguir tomar um sorvete tão ruim, pois é o único que eles podem pagar e ter acesso. Realmente deprimente.

Sorveteria Coppelia


Finalizamos o dia jantando no Hotel Meliá Habana, onde comemos carne, arroz e fritas, nada de saladas, frutas ou gelo, por favor!

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2021

MAUÁ E RIBEIRÃO PIRES

 

MAUÁ E RIBEIRÃO PIRES

 

Tão próximas, mas, ainda sim, tão distantes. Talvez essa seja a melhor definição do relacionamento entre a capital paulista e as cidades de Mauá e Ribeirão Pires. Localizados a apenas 27 e 36 km de distância respectivamente, tais municípios se situam geograficamente muito perto de São Paulo capital, mas parecem estar muito longe, pois há um considerável desconhecimento por parte dos paulistanos de ambas localidades vizinhas, cujas histórias estão intimamente ligadas à da capital. Poucos paulistanos já visitaram as duas cidades e conhecem um pouco da história e da importância de Mauá e Ribeirão Pires.

Já os moradores dessas cidades se deslocam à capital com frequência muito maior, pois grande parte de seus moradores trabalham ou possuem atividades comerciais na cidade de São Paulo, retornando a seus lares ao final do dia apenas para dormirem.

Há algum tempo tive a oportunidade de explorar Mauá e Ribeirão Pires. O que começou com uma simples visita ao Museu Barão de Mauá acabou se transformando em um passeio bem mais longo, durante o qual eu fui descobrindo lugares surpreendentes e muito interessantes, dos quais eu nunca havia lido ou ouvido falar a respeito.

Dessa forma, decidi redigir o presente artigo para estimular que outras pessoas também se animem a visitar e descobrir os atrativos turísticos e históricos dessas cidades da Grande São Paulo. Espero que minhas fotos e palavras despertem a curiosidade de alguém para fazer o percurso que eu fiz e possa descobrir lugares inusitados e belos, bastante próximos à São Paulo.

 

MAUÁ

Começaremos por Mauá, minha primeira parada. Uma das características mais marcantes da cidade é de não ser cortada por nenhum curso d’água proveniente de outro município. Devido à sua elevada altitude, todos os rios que cruzam seu território nascem na própria cidade, sendo o mais importante deles o Rio Tamanduateí, que nasce dentro do Parque Ecológico da Gruta de Santa Luzia.

Mauá, um nome de origem tupi, significa “terra ou cidade elevada”. Inicialmente, o nome “Mauá” fazia alusão à zona portuária do Rio de Janeiro, na qual Irineu Evangelista de Souza, o famoso “Barão de Mauá”, um dos maiores empreendedores de toda a história do Brasil, construiu muitos empreendimentos. Com o passar dos anos o povoado, que até então se chamava Pilar, foi beneficiado em 1926 com uma estação de trem local, denominada Mauá, em homenagem ao Barão, que possuía terras na região. Desta forma, toda a região em torno da nova estação passou a se chamar também Mauá, e o nome Pilar, que fazia referência ao Caminho do Pilar, que ligava a Vila de São Bernardo a Igreja do Pilar, acabou sendo abandonado.

A área do atual Grande ABC foi inicialmente habitada pelos índios Guaianazes, que foram expulsos da região pelos índios Tupiniquins. A região específica onde se encontra Mauá atualmente foi ocupada formalmente a partir do século XVIII. Toda a área era dividida entre três fazendas, a Bocaina, cuja sede hoje abriga o Museu Barão de Mauá, a do Oratório, que abrangia partes da capital e do atual município de Santo André, e a do Capitão João.

Mauá começou a se tornar importante economicamente com a chegada da ferrovia que ligava São Paulo ao porto de Santos, que apresentou grandes desafios aos engenheiros britânicos, responsáveis por sua construção, a partir de 1860. Uma curiosidade é que o caminho que era utilizado pelos índios para circular na região é o mesmo que é hoje utilizado pela estrada de ferro, pois os ingleses aproveitaram a trilha descoberta pelos indígenas. A outra trilha indígena usada antigamente é a que hoje é conhecida com o a Estrada Velha do Mar. A nova ferrovia teve grande importância econômica, pois permitia o escoamento da grande produção cafeeira proveniente do Estado de São Paulo até o porto de Santos, de onde era transportada para outras parte do Brasil e do mundo. O povoado de Pilar, posteriormente Mauá, foi beneficiado pela criação de uma estação dentro de seu território, o que alavancou sua economia de forma decisiva e marcante.

Na época da fundação da Vila do Pilar, tal povoado pertencia à São Bernardo. No entanto, Santo André sempre exerceu maior influência sob o novo município, que viria se tornar Mauá. Em 1938, Mauá foi integrada ao município de Santo André, o que perdurou até 1953, quando um plebiscito local permitiu que a população optasse pela autonomia do município de Mauá.

A primeira atividade econômica desenvolvida na região, ainda no início do século XIX, foi a extração de pedras, ao longo do antigo Caminho do Pilar, depois denominado Estrada das Pedreiras. Toda essa região tornou-se fornecedora de matéria prima para a produção de paralelepípedos e calçadas de ruas no Grande ABC e na cidade de São Paulo.

Mauá tem uma forte tradição industrial e, durante muito tempo, foi conhecida nacionalmente como a “Capital Nacional da Porcelana”. Entre as principais indústrias que se estabeleceram no município podemos mencionar a Porcelana Mauá, pioneira no ramo de porcelana fina no Brasil; a Indústria Matarazzo; a Cerâmica Cerqueira Leite; a Atlantis (britânica), e o Curtume Mauá. As décadas de 1940 e 1950 foram o apogeu econômico da região, pois suas indústrias de porcelana produziam e comercializavam seus artigos em todo o Brasil, Europa e Estados Unidos.

Dois fatores foram fundamentais para o estabelecimento da indústria ceramista na região: o solo rico em argila branca e a fixação na região de imigrantes com vasto conhecimento das técnicas ceramistas.

A chegada da indústria petroquímica na cidade se deu em 1953, com a implantação da Refinaria União, que iniciou suas operações no ano seguinte, empregando 700 funcionários na que era então a maior refinaria do país, nas mãos do capital privado. Em 1974, em meio à crise do petróleo, o governo do Regime Militar comprou a maior parte das ações da refinaria, tornando a Petrobrás a responsável por sua gestão. Até hoje o setor industrial é o que mais gera empregos e contribui para a arrecadação de impostos no município.

Atualmente, grandes indústrias tem suas fábricas em Mauá. Entre elas, podemos citar a Firestone, Tintas Coral, Goodyear, Valisère, Philips, Petrobrás, Alcan, Cofap, Suzano Petroquímica e Braskem. Mauá apresenta atualmente o 62º maior Produto Interno Bruto (PIB) dentre todos os municípios brasileiros. Um dos fatores que contribui para tal relevância econômica é o acesso facilitado ao Rodoanel, um dos mais importante eixos rodoviários do Brasil.

Dentre as atrações turísticas do munícipio, podemos destacar duas principais: o Museu Barão de Mauá e o Parque Ecológico da Gruta de Santa Luzia.

O Parque Ecológico da Gruta de Santa Luzia é uma área de vegetação da Mata Atlântica em recuperação, sendo considerado uma Área Especial de Interesse Ambiental (AEIA). O parque teve seu paisagismo projetado pelo renomado Roberto Burle Marx, que se inspirou no bosque de Konstanza, entre a França e a Suíça. Foi criado em 1975 a fim de preservar as nascentes do Rio Tamanduateí.

Parque Gruta de Santa Luzia


Dentro do parque podemos visitar a minúscula Gruta de Santa Luzia, cujo acesso se dá através de uma pequena escada esculpida na pedra. O parque em si é bastante amplo e grandemente utilizado pela população local para atividades de lazer.

Acesso à gruta de Santa Luzia


A segunda atração mais importante da cidade é o Museu Barão de Mauá, que foi sede da grande fazenda Bocaina. Atualmente o museu é o principal responsável pela preservação da memória local e pela pesquisa histórica do município. A casa na qual o museu está estabelecido foi construída ao longo do século XVIII, através do emprego da técnica da taipa de pilão, tendo sido tombada pelo patrimônio histórico por ser um magnífico exemplo de Casa Bandeirista. Em 1982 foi desapropriada e se tornou então sede do Museu Barão de Mauá. Infelizmente não há objetos relativos ao Barão de Mauá dentro do museu, apenas objetos desconexos, acumulados sem nenhum critério museológico aparente. O maior atrativo do local é a casa em si, que está muito bem mantida. Há discussões inconclusivas entre os vários historiadores e estudiosos do local, pois considera-se que em algum momento tal casa tenha sido ocupada pelos jesuítas, pois em uma das portas se encontra um símbolo jesuítico talhado nela, visível até os dias de hoje.


Museu Barão de Mauá


Insígnia Jesuítica na porta


 

RIBEIRÃO PIRES

A região onde se encontra atualmente a cidade de Ribeirão Pires se chamava originalmente Caguassu, cujo significado é “mata grande”. A história da cidade é profundamente ligada à de Mauá, pois o povoado de Pilar, antigo nome de Mauá, se desenvolveu em torno da Capela de Nossa Senhora do Pilar, que foi construída em 1714 e até hoje está localizada no município de Ribeirão Pires.

A história de Ribeirão Pires se iniciou no período colonial, quando era um caminho de passagem do litoral ao planalto de Piratininga, onde se situaria futuramente a cidade de São Paulo.

O nome da cidade surgiu quando as duas famílias mais importantes da região, os portugueses da família Pires e os espanhóis da família Camargo, arranjaram um casamento entre seus filhos para pôr fim às rivalidades e desavenças que vinham ocorrendo há muitos anos entre ambas famílias. O novo casal se fixou na confluência do rio Ribeirão Pires e rio Grande. Tal local passou a ser denominado como Ribeirão dos Pires, posteriormente, sendo encurtado para simplesmente Ribeirão Pires.

Em 1549, tendo em vista os constantes ataques dos índios Tamoios aos Tupi Guaranis que viviam na região atual de Ribeirão Pires, foi necessário construir um posto de observação protegido por uma paliçada, que pudesse auxiliar seus guardiães de possíveis ataques dos Tamoios. Dentro de tal paliçada foi construída uma pequena capela, exatamente no mesmo local onde se encontra a Igreja de Santo Antônio, no topo do Mirante Santo Antônio.

Mirante Santo Antônio


A atual igreja foi construída entre 1942 e 1950 pela Associação Beneficente Amigos de Santo Antônio, uma entidade constituída por carregadores do antigo pátio ferroviário que foram impedidos de frequentar sua igreja original, devido à desentendimentos com o proprietário do terreno. Devido à tal situação, reuniram esforços e ergueram seu novo templo, a 807 metros acima do nível do mar, em um local que possui uma das melhores vistas da cidade e de toda a ferrovia que corta a região.

Igreja de Santo Antônio


No entanto, a maior atração da localidade é a bela Capela de Nossa Senhora do Pilar, marco importantíssimo na história de Ribeirão Pires e de Mauá. Situada no topo de uma longuíssima escadaria em formato de zigue-zague, parece abençoar toda a região, com sua história e tradição. Lá do topo se tem uma bela vista das redondezas e pode-se visitar um grande exemplar de construção bandeirista. A capela foi construída por Antônio Correa de Lemos, Capitão Mor da Capitania de São Vicente, em 1714. Ele foi um respeitado bandeirante que explorou a atividade da mineração e acabou ficando enfermo. Fez uma promessa de que se recuperasse sua saúde ergueria um templo em homenagem à Nossa Senhora do Pilar, do qual era devoto. Como esse milagre ocorreu, Antônio Correa de Lemos cumpriu sua promessa e construiu a capela, que surpreendentemente permanece praticamente intacta e em perfeito estado de conservação até os dias de hoje. Seria esse mais um dos milagres promovidos por Nossa Senhora do Pilar?


Capela N.S. do Pilar


Se esse meu breve relato despertar sua curiosidade, vá pessoalmente conhecer os locais descritos acima e os divulgue, contribuindo você também para a valorização e reconhecimento desse importante patrimônio para todos os brasileiros e, em particular, para todos os amantes da história e cultura do Brasil.

Todas as fotos da matéria foram tiradas por Marco André Briones, em novembro de 2018.

Bibliografia usada:

Mauá – Entendendo o passado, trabalhando o presente e construindo o futuro – de William Puntschart

Etapas evolutivas de Ribeirão Pires – de Antonio Simões

HAVANA - SONHO OU PESADELO? - PARTE 2

 

PARTE 2

 

Rua Comercial


DIA 3

Comecei o dia visitando o Templete, que é um pequeno templo, como já indica o próprio nome, que marca o local onde foi realizada a primeira missa em Havana, em 1519. Está bem preservado e é bonito.

El Templete


Em seguida, fui ao Palacio de los Capitanes Generales, que era a antiga sede do governo espanhol. Atualmente é a sede do Museu da Cidade de Havana. Também é um local muito belo e bem preservado. Um dos mais interessantes que visitei durante em toda minha estadia em Cuba. Possui um belo pátio interno com muita vegetação e flores, além de algumas estátuas de antigos “Capitanes Generales”. Todo o prédio apresenta lindos arcos em sua parte interna.



Palacio de los Capitanes Generales


Logo após o término dessa visita, continuei meu passeio pelo Castillo de la Real Fuerza. Trata-se de um verdadeiro castelo, com todas suas características marcantes, um lugar realmente fantástico. Ele foi feito todo de pedra e é o mais antigo de todas as Américas. Sua finalidade era a de combater os ataques de piratas a Havana. Dentro dele podemos ver muitas peças interessantes, entre elas, um baú da época repleto de moedas de prata do período do domínio espanhol em Cuba.

Castillo de la Real Fuerza


Baú com moedas de prata


Já na hora do almoço, fui à Bodeguita del Medio, talvez o restaurante mais famoso de Havana. O local é repleto de fotos nas paredes de todas as celebridades que já estiveram lá, entre presidentes, cantores, atores, esportistas renomados, enfim, muita gente conhecida internacionalmente que, ao visitar o país, sempre aparece por lá para um almoço típico cubano. No meu caso, eu acabei comendo mesmo um contra filé com arroz e feijão preto.

La Bodeguita del Medio


No período da tarde pude conhecer o renomado Hotel Nacional, o mais famoso do país. Ele é uma espécie de Copacabana Palace” de Cuba, com estilo arquitetônico bastante marcante, com amplos pátios internos, piscinas, lojas de conveniência, bares e tudo mais. A vista dele também é excelente, pois ele se situa no topo de uma pequena elevação, o que lhe propicia uma visão privilegiada da costa de Havana. Bebi um Mojito lá no bar, olhando a vastidão do mar azul caribenho.

Hotel Nacional


La Floridita


A próxima parada foi o renomado bar La Floridita, no qual o drink Daiquiri foi inventado por ninguém menos do que Ernest Hemingway, o lendário prêmio Nobel de Literatura americano, que passou longos anos em Cuba e era amigo pessoal de Fidel Castro. Conta a lenda que o próprio Hemingway indicou ao barman quais os ingredientes que ele queria que fossem misturados para seu consumo próprio, o que acabou levando à criação de um novo drink, batizado de Daiquiri. Dentro do bar há uma estátua de bronze em tamanho natural do famoso escritor, sentado em uma das banquetas, pois ele era um frequentador assíduo do La Floridita. Tive a sorte também de assistir a uma bela apresentação musical ao vivo no bar, com músicos muito talentosos.

Estátua de Hemingway


Para finalizar um longo dia de passeios, jantei no hotel Meliá Havana, no restaurante La Scala. O prato foi uma Lasanha à Bolonhesa.

 

DIA 4

Já estava na metade da minha estadia em Cuba nesse dia, no qual iniciei minhas atividades tomando o café da manhã no Hotel Meliá Habana. Na sequência, fiz uma das visitas mais interessantes de toda a viagem: fui ao antigo Palácio Presidencial de Cuba que, após a Revolução Socialista, foi transformado em Museu da Revolução. Logo na entrada do museu, na escadaria principal, pude ver o busto do poeta José Martí e, logo ao lado, inúmeras marcas de tiros e balas cravejadas no mármore da parede, mantidos até hoje, para lembrar como foi a invasão desse prédio pelos revolucionários em 1957, quando houve um combate feroz e intenso.

Museu da Revolução


Marcas de tiroteio


Pude também visitar o antigo gabinete presidencial, de onde governaram Cuba todos seus presidentes, até Fulgêncio Batista, deposto por Fidel Castro quando esse chegou ao poder. Vi também vários cartazes antiamericanos, ridicularizando os EUA e seus presidentes, como George Bush e Ronald Reagan.

Sátira à Ronald Reagan


É possível também vermos destroços de um avião americano abatido pelas forças cubanas, que é exibido como um grande troféu, além de foguetes  e mísseis soviéticos, lanchas e jipes de ataque usados pelas forças cubanas, aviões e, dentro de uma espécie de aquário gigante, a peça mais venerada pelo governo cubano: a lancha original denominada Granma, na qual Fidel Castro e seu grupo viajou do México até o desembarque em Cuba, dando início à Revolução Socialista que teve sucesso em tomar o poder no país. Há vários guardas de sentinela no local, protegendo tal peça que é considerada um símbolo nacional. Em alguns lugares eu tentei fazer fotos, mas fui proibido pelos soldados cubanos. Em outros, tive sucesso e consegui fazer muitos registros fotográficos.

Avião Americano abatido


Barco Granma


Parei no Hotel NH para tomar uma Coca Cola, pois o calor era muito intenso. Depois da pausa, visitei o Capitólio, um lindo prédio inspirado no Capitólio em Washington. Esse era o antigo local de trabalho dos deputados e senadores cubanos. Um prédio muito imponente e bem conservado.

Capitólio


Prossegui a caminhada para o bairro chinês, China Town, no qual vi uma grande quantidade de lojas comerciais muito populares. Muitas delas não tinham sequer algum artigo à venda, apenas funcionários sentados sem fazer nada, já que todos no país são funcionários públicos e recebem seus míseros salários do governo, tendo alguma atividade a ser feita ou não. Foi muito triste ver a condição precaríssima do comércio e de seus funcionários. Nunca havia visto nada sequer parecido no Brasil, nem nos lugares mais pobres de nosso país. Alguns lugares foram tão deprimentes que eu nem tive coragem de registrar em fotos, como um açougue que vendia carne da pior qualidade possível, sem qualquer tipo de refrigeração, com milhares de moscas pousadas sobre as peças, sem qualquer tipo de higiene. Uma coisa realmente horrorosa.

China Town


Almocei no Hotel NH, onde comi um misto quente e bebi novamente a famosa Tukola, o refrigerante nacional cubano.

Conheci a Ciudad Libertad, onde morou o ditador Fulgêncio Batista após o atentado que sofreu por parte dos revolucionários. Trata-se de uma antiga base militar, na qual ele passou a ser protegido constantemente por forças militares de sua confiança até sua queda. Vi vários meninos uniformizados jogando baseball nos campos dentro dessa base militar.

Ciudad Libertad


Passei depois pela Marina Hemingway, batizada em homenagem ao grande escritor, que era um amante de Cuba.

Marina Hemingway


Já ao final da tarde, fui de carro até a Escola Latino Americana de Medicina, conhecida por ELAM, nos arredores de Havana. Não a conheci por dentro, mas a impressão que tive do prédio, ao visitá-lo de fora, foi a pior possível. Parecia um imenso presídio, no qual são formados os “médicos” cubanos, que foram enviados à vários países do mundo, com a finalidade de arrecadar recursos para manter a ditadura cubana viva até hoje.

Escola Latino Americana de Medicina


Antes de regressar à capital, fui também ao infame porto de Mariel, que foi dado a Cuba pelo governo brasileiro, durante seu período de grande proximidade com Fidel Castro. Não o visitei por dentro, apenas por fora, pois o local não é aberto a turistas. Fiquei muito revoltado ao ver que uma enorme quantia de recursos obtidos de nossos impostos foi desviado para construir um porto novo em uma ditadura caribenha, enquanto tantos portos do Brasil se encontram em situação precária de funcionamento, com necessidade urgente de renovação e modernização. Uma verdadeira afronta ao povo brasileiro e a seus contribuintes. Tais recursos brasileiros jamais serão recuperados, e podem ser considerados investimento a fundo perdido. Uma vergonha.

Porto de Mariel


Ao regressar a Havana, caminhei pelo Malecón, a famosa avenida beira mar que contorna grande parte da costa da cidade e onde, no período pré-revolução socialista, havia os melhores hotéis, prédios e residências. Hoje em dia, estão todos abandonados, literalmente caindo aos pedaços, em péssimo estado, sem nenhuma pintura ou manutenção. A vista do mar é linda, mas se olharmos para o lado oposto, a visão que temos é de um pesadelo, um monte de escombros que está prestes a desmoronar a qualquer instante.

Malecón


Assisti ao famoso espetáculo do Tropicana, um antigo cabaré criado nos anos 40/50 pelos mafiosos americanos que o usavam para lavagem de dinheiro, complôs, e outras atividades não menos ilícitas. O show em si foi muito bonito, com uma bela atuação de músicos e dançarinos. Como era de se esperar, a plateia era composta basicamente de turistas estrangeiros. Acho que os únicos cubanos ali eram os garçons e os artistas no palco.



Para finalizar, comi uma pizza de presunto e queijo novamente no Hotel Habana Libre, uma das poucas opções disponíveis para jantar na cidade devido ao horário de término do espetáculo no Tropicana.