MAUÁ
E RIBEIRÃO PIRES
Tão próximas, mas, ainda sim, tão distantes. Talvez
essa seja a melhor definição do relacionamento entre a capital paulista e as
cidades de Mauá e Ribeirão Pires. Localizados a apenas 27 e 36 km de distância
respectivamente, tais municípios se situam geograficamente muito perto de São
Paulo capital, mas parecem estar muito longe, pois há um considerável
desconhecimento por parte dos paulistanos de ambas localidades vizinhas, cujas
histórias estão intimamente ligadas à da capital. Poucos paulistanos já
visitaram as duas cidades e conhecem um pouco da história e da importância de
Mauá e Ribeirão Pires.
Já os moradores dessas cidades se deslocam à capital
com frequência muito maior, pois grande parte de seus moradores trabalham ou
possuem atividades comerciais na cidade de São Paulo, retornando a seus lares
ao final do dia apenas para dormirem.
Há algum tempo tive a oportunidade de explorar Mauá e Ribeirão
Pires. O que começou com uma simples visita ao Museu Barão de Mauá acabou se
transformando em um passeio bem mais longo, durante o qual eu fui descobrindo
lugares surpreendentes e muito interessantes, dos quais eu nunca havia lido ou
ouvido falar a respeito.
Dessa forma, decidi redigir o presente artigo para
estimular que outras pessoas também se animem a visitar e descobrir os
atrativos turísticos e históricos dessas cidades da Grande São Paulo. Espero
que minhas fotos e palavras despertem a curiosidade de alguém para fazer o
percurso que eu fiz e possa descobrir lugares inusitados e belos, bastante
próximos à São Paulo.
MAUÁ
Começaremos por Mauá, minha primeira parada. Uma das
características mais marcantes da cidade é de não ser cortada por nenhum curso
d’água proveniente de outro município. Devido à sua elevada altitude, todos os
rios que cruzam seu território nascem na própria cidade, sendo o mais
importante deles o Rio Tamanduateí, que nasce dentro do Parque Ecológico da Gruta
de Santa Luzia.
Mauá, um nome de origem tupi, significa “terra ou
cidade elevada”. Inicialmente, o nome “Mauá” fazia alusão à zona portuária do
Rio de Janeiro, na qual Irineu Evangelista de Souza, o famoso “Barão de Mauá”,
um dos maiores empreendedores de toda a história do Brasil, construiu muitos
empreendimentos. Com o passar dos anos o povoado, que até então se chamava
Pilar, foi beneficiado em 1926 com uma estação de trem local, denominada Mauá,
em homenagem ao Barão, que possuía terras na região. Desta forma, toda a região
em torno da nova estação passou a se chamar também Mauá, e o nome Pilar, que
fazia referência ao Caminho do Pilar, que ligava a Vila de São Bernardo a
Igreja do Pilar, acabou sendo abandonado.
A área do atual Grande ABC foi inicialmente habitada
pelos índios Guaianazes, que foram expulsos da região pelos índios Tupiniquins.
A região específica onde se encontra Mauá atualmente foi ocupada formalmente a
partir do século XVIII. Toda a área era dividida entre três fazendas, a
Bocaina, cuja sede hoje abriga o Museu Barão de Mauá, a do Oratório, que
abrangia partes da capital e do atual município de Santo André, e a do Capitão
João.
Mauá começou a se tornar importante economicamente com
a chegada da ferrovia que ligava São Paulo ao porto de Santos, que apresentou
grandes desafios aos engenheiros britânicos, responsáveis por sua construção, a
partir de 1860. Uma curiosidade é que o caminho que era utilizado pelos índios
para circular na região é o mesmo que é hoje utilizado pela estrada de ferro,
pois os ingleses aproveitaram a trilha descoberta pelos indígenas. A outra
trilha indígena usada antigamente é a que hoje é conhecida com o a Estrada
Velha do Mar. A nova ferrovia teve grande importância econômica, pois permitia
o escoamento da grande produção cafeeira proveniente do Estado de São Paulo até
o porto de Santos, de onde era transportada para outras parte do Brasil e do
mundo. O povoado de Pilar, posteriormente Mauá, foi beneficiado pela criação de
uma estação dentro de seu território, o que alavancou sua economia de forma
decisiva e marcante.
Na época da fundação da Vila do Pilar, tal povoado
pertencia à São Bernardo. No entanto, Santo André sempre exerceu maior
influência sob o novo município, que viria se tornar Mauá. Em 1938, Mauá foi
integrada ao município de Santo André, o que perdurou até 1953, quando um
plebiscito local permitiu que a população optasse pela autonomia do município
de Mauá.
A primeira atividade econômica desenvolvida na região,
ainda no início do século XIX, foi a extração de pedras, ao longo do antigo
Caminho do Pilar, depois denominado Estrada das Pedreiras. Toda essa região
tornou-se fornecedora de matéria prima para a produção de paralelepípedos e
calçadas de ruas no Grande ABC e na cidade de São Paulo.
Mauá tem uma forte tradição industrial e, durante muito
tempo, foi conhecida nacionalmente como a “Capital Nacional da Porcelana”.
Entre as principais indústrias que se estabeleceram no município podemos
mencionar a Porcelana Mauá, pioneira no ramo de porcelana fina no Brasil; a Indústria
Matarazzo; a Cerâmica Cerqueira Leite; a Atlantis (britânica), e o Curtume Mauá.
As décadas de 1940 e 1950 foram o apogeu econômico da região, pois suas
indústrias de porcelana produziam e comercializavam seus artigos em todo o
Brasil, Europa e Estados Unidos.
Dois fatores foram fundamentais para o estabelecimento
da indústria ceramista na região: o solo rico em argila branca e a fixação na
região de imigrantes com vasto conhecimento das técnicas ceramistas.
A chegada da indústria petroquímica na cidade se deu em
1953, com a implantação da Refinaria União, que iniciou suas operações no ano
seguinte, empregando 700 funcionários na que era então a maior refinaria do
país, nas mãos do capital privado. Em 1974, em meio à crise do petróleo, o
governo do Regime Militar comprou a maior parte das ações da refinaria,
tornando a Petrobrás a responsável por sua gestão. Até hoje o setor industrial
é o que mais gera empregos e contribui para a arrecadação de impostos no
município.
Atualmente, grandes indústrias tem suas fábricas em
Mauá. Entre elas, podemos citar a Firestone, Tintas Coral, Goodyear, Valisère,
Philips, Petrobrás, Alcan, Cofap, Suzano Petroquímica e Braskem. Mauá apresenta
atualmente o 62º maior Produto Interno Bruto (PIB) dentre todos os municípios
brasileiros. Um dos fatores que contribui para tal relevância econômica é o
acesso facilitado ao Rodoanel, um dos mais importante eixos rodoviários do
Brasil.
Dentre as atrações turísticas do munícipio, podemos
destacar duas principais: o Museu Barão de Mauá e o Parque Ecológico da Gruta
de Santa Luzia.
O Parque Ecológico da Gruta de Santa Luzia é uma área
de vegetação da Mata Atlântica em recuperação, sendo considerado uma Área
Especial de Interesse Ambiental (AEIA). O parque teve seu paisagismo projetado
pelo renomado Roberto Burle Marx, que se inspirou no bosque de Konstanza, entre
a França e a Suíça. Foi criado em 1975 a fim de preservar as nascentes do Rio
Tamanduateí.
Parque Gruta de Santa Luzia |
Dentro do parque podemos visitar a minúscula Gruta de
Santa Luzia, cujo acesso se dá através de uma pequena escada esculpida na
pedra. O parque em si é bastante amplo e grandemente utilizado pela população
local para atividades de lazer.
Acesso à gruta de Santa Luzia |
A segunda atração mais importante da cidade é o Museu
Barão de Mauá, que foi sede da grande fazenda Bocaina. Atualmente o museu é o principal
responsável pela preservação da memória local e pela pesquisa histórica do
município. A casa na qual o museu está estabelecido foi construída ao longo do
século XVIII, através do emprego da técnica da taipa de pilão, tendo sido
tombada pelo patrimônio histórico por ser um magnífico exemplo de Casa
Bandeirista. Em 1982 foi desapropriada e se tornou então sede do Museu Barão de
Mauá. Infelizmente não há objetos relativos ao Barão de Mauá dentro do museu, apenas
objetos desconexos, acumulados sem nenhum critério museológico aparente. O
maior atrativo do local é a casa em si, que está muito bem mantida. Há
discussões inconclusivas entre os vários historiadores e estudiosos do local,
pois considera-se que em algum momento tal casa tenha sido ocupada pelos
jesuítas, pois em uma das portas se encontra um símbolo jesuítico talhado nela,
visível até os dias de hoje.
Museu Barão de Mauá |
RIBEIRÃO PIRES
A região onde se encontra atualmente a cidade de
Ribeirão Pires se chamava originalmente Caguassu, cujo significado é “mata
grande”. A história da cidade é profundamente ligada à de Mauá, pois o povoado
de Pilar, antigo nome de Mauá, se desenvolveu em torno da Capela de Nossa
Senhora do Pilar, que foi construída em 1714 e até hoje está localizada no
município de Ribeirão Pires.
A história de Ribeirão Pires se iniciou no período
colonial, quando era um caminho de passagem do litoral ao planalto de
Piratininga, onde se situaria futuramente a cidade de São Paulo.
O nome da cidade surgiu quando as duas famílias mais
importantes da região, os portugueses da família Pires e os espanhóis da
família Camargo, arranjaram um casamento entre seus filhos para pôr fim às
rivalidades e desavenças que vinham ocorrendo há muitos anos entre ambas
famílias. O novo casal se fixou na confluência do rio Ribeirão Pires e rio
Grande. Tal local passou a ser denominado como Ribeirão dos Pires,
posteriormente, sendo encurtado para simplesmente Ribeirão Pires.
Em 1549, tendo em vista os constantes ataques dos
índios Tamoios aos Tupi Guaranis que viviam na região atual de Ribeirão Pires,
foi necessário construir um posto de observação protegido por uma paliçada, que
pudesse auxiliar seus guardiães de possíveis ataques dos Tamoios. Dentro de tal
paliçada foi construída uma pequena capela, exatamente no mesmo local onde se
encontra a Igreja de Santo Antônio, no topo do Mirante Santo Antônio.
Mirante Santo Antônio |
A atual igreja foi construída entre 1942 e 1950 pela
Associação Beneficente Amigos de Santo Antônio, uma entidade constituída por
carregadores do antigo pátio ferroviário que foram impedidos de frequentar sua
igreja original, devido à desentendimentos com o proprietário do terreno.
Devido à tal situação, reuniram esforços e ergueram seu novo templo, a 807
metros acima do nível do mar, em um local que possui uma das melhores vistas da
cidade e de toda a ferrovia que corta a região.
Igreja de Santo Antônio |
No entanto, a maior atração da localidade é a bela
Capela de Nossa Senhora do Pilar, marco importantíssimo na história de Ribeirão
Pires e de Mauá. Situada no topo de uma longuíssima escadaria em formato de
zigue-zague, parece abençoar toda a região, com sua história e tradição. Lá do
topo se tem uma bela vista das redondezas e pode-se visitar um grande exemplar
de construção bandeirista. A capela foi construída por Antônio Correa de Lemos,
Capitão Mor da Capitania de São Vicente, em 1714. Ele foi um respeitado
bandeirante que explorou a atividade da mineração e acabou ficando enfermo. Fez
uma promessa de que se recuperasse sua saúde ergueria um templo em homenagem à
Nossa Senhora do Pilar, do qual era devoto. Como esse milagre ocorreu, Antônio
Correa de Lemos cumpriu sua promessa e construiu a capela, que surpreendentemente
permanece praticamente intacta e em perfeito estado de conservação até os dias
de hoje. Seria esse mais um dos milagres promovidos por Nossa Senhora do Pilar?
Capela N.S. do Pilar |
Se esse meu breve relato despertar sua curiosidade, vá pessoalmente conhecer os locais descritos acima e os divulgue, contribuindo você também para a valorização e reconhecimento desse importante patrimônio para todos os brasileiros e, em particular, para todos os amantes da história e cultura do Brasil.
Todas as fotos da
matéria foram tiradas por Marco André Briones, em novembro de 2018.
Bibliografia
usada:
Mauá
– Entendendo o passado, trabalhando o presente e construindo o futuro – de
William Puntschart
Etapas
evolutivas de Ribeirão Pires – de Antonio Simões