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sexta-feira, 11 de dezembro de 2020

ESTRELA CADENTE

 ESTRELA CADENTE

 


Pergunte à qualquer estrangeiro qual é a primeira imagem que lhe vem à cabeça quando se fala em Brasil. Muito provavelmente a resposta será: Rio de Janeiro.

Não é por acaso que tal referência continua ocorrendo até hoje. Durante décadas, a imagem da dita “Cidade Maravilhosa” preencheu páginas de revistas, apareceu em filmes, foi cantada pela Bossa Nova e pelo samba e, através destes, deu a volta ao mundo, levando ao exterior uma imagem pitoresca, alegre, belíssima daquela que era a representação máxima do Brasil e de seu povo.

O imaginário de várias gerações de estrangeiros foi povoado por palavras mágicas, de uma língua incompreensível, tais como “Copacabana” e “Ipanema”.

Aqueles que por lá haviam passado confirmavam a veracidade do que era divulgado mundo afora. O paraíso realmente ali se encontrava.

Grupos de estrangeiros vinham de todas as partes do mundo para se fartarem com a beleza sinuosa e feminina da antiga capital do estado da Guanabara e do Brasil. Ao chegar, se deslumbravam com as magníficas vistas da cidade do Rio de Janeiro, assim como com a hospitalidade e o bom-humor dos cariocas.

Carmem Miranda, Tom Jobim, Vinícius de Morais e muitos outros contribuíram para povoar os sonhos de muitos estrangeiros com ícones tropicais, tão atraentes especialmente para povos provenientes de países distantes, de clima frio, onde o sol simboliza uma alegria constante, vida e puro lazer.

Quantos estrangeiros não vieram para o Brasil atrás da beleza tão real e, ao mesmo tempo, imaginária e idealizada da musa de Vinícius e Tom, a garota de Ipanema? Se os gregos tinham na Vênus de Milo o seu ideal de beleza, a dupla de compositores da bossa nova criou a versão nacional, a nossa Vênus bronzeada.

Porém, algo aconteceu que não estava nos planos: Brasília

A mudança da capital federal para o interior do país, no meio do planalto central, foi um golpe duríssimo para a “Cidade Maravilhosa”. Tão duro, que ela não conseguiu se recuperar até hoje.

Brasília necessariamente atraiu a elite política do país, assim como as sedes de ministérios, importantes organizações, embaixadas, altos funcionários do governo e todo um corpo de burocratas para povoar e preencher todos os cargos existentes com a criação da nova capital.

Muitos foram os que deixaram posições importantes no governo federal porque não queriam abandonar o Rio de Janeiro, trocando-o por um destino incerto no meio do cerrado, tão árido e distante.

Porém, os cariocas continuaram acreditando que apenas a beleza da cidade e seus encantos seriam suficientes para perpetuar a qualidade de vida que tinham, assim como o estilo de vida pacato, despreocupado, irreverente e divertido que sempre caracterizara a agora ex-capital federal.

Houve um empobrecimento generalizado na cidade, o padrão de vida de milhares de pessoas começou a declinar. Muitos perderam seus empregos, por não quererem se mudar para Brasília. O Rio de Janeiro deixou de ser o ator principal para ter um papel cada vez mais de figurante no cenário nacional.

Mesmo assim, os turistas ainda continuavam a chegar em grande quantidade. Todos em busca de um paraíso que, aos poucos, ia desaparecendo.

O povo carioca entrou numa crise de identidade. Quem somos nós? Qual o nosso papel no país? Qual será o nosso futuro, agora que deixamos de ser o centro político, econômico e cultural do país? – eram perguntas que estavam dentro de cada um.

O crescimento econômico de São Paulo só fez acelerar e acentuar tal declínio do Rio de Janeiro, que passou gradualmente a ser apenas um destino turístico dos estrangeiros, que vinham para a “terra da garoa” para trabalhar e fazer negócios.

Muitos foram os fatores que contribuíram para que a sociedade carioca e a cidade do Rio de Janeiro chegassem ao atoleiro em que se encontram atualmente. Primeiramente, o espírito da malandragem, que antigamente era algo quase que folclórico, beirando a ingenuidade, tornou-se algo diferente, maléfico, que foi corroendo as bases da sociedade.

O desemprego, o surgimento das primeiras favelas, a crise na educação e uma contínua sucessão de governantes corruptos e incompetentes apenas acentuou a crise carioca, acelerando o declínio da cidade, outrora maravilhosa.

Os dias de glória foram ficando para trás, na memória daqueles que os presenciaram, e que não se conformam com cenário caótico que surgiu nas últimas décadas. O sonho acabou. Em seu lugar, veio o pesadelo.

Atualmente, o Rio de Janeiro não é mais do que uma ruína do passado. Uma pálida cópia da grande cidade que foi. Seu povo infelizmente aceita tal sina, acreditando serem ainda privilegiados por ali residirem. No entanto, não percebem que o paraíso se tornou um inferno. Mesmo que a vista da cidade ainda seja linda.

Bem de cima. Bem de longe.

Teço tais comentários não com despeito ou raiva, mas com tristeza. Eu mesmo sou carioca, e ainda pude presenciar resquícios da época gloriosa do Rio de Janeiro em minha infância. Infelizmente, agora só restam as lembranças de um tempo que jamais voltará.

A auto-estima dos cariocas só não está mais baixa pelo fato da Rede Globo ainda ter seu núcleo de teledramaturgia na cidade. O Projac ainda é responsável pela propagação das belas imagens da praia, do Corcovado, das lindas mulheres, enfim, de todo um cenário paradisíaco, cuidadosamente retocado nos estúdios, onde são removidos quaisquer vestígios de sujeira, violência, caos ou qualquer outra coisa que venha a macular o sonho que se propõem a vender.

Ao se verem nas telas de TV, os cariocas pensam que são privilegiados em residirem em tal paraíso, mesmo que ele não corresponda à realidade que pode ser vista das janelas de seus apartamentos e barracos.

Temo pelo destino da cidade quando a Rede Globo decidir levar para São Paulo o seu núcleo de teledramaturgia, pois lá já se encontra o núcleo de jornalismo.

Para a auto-estima do povo do Rio de Janeiro, tal “abandono”, tal “traição” poderá ser um golpe quase mortal.  Levando a cidade à uma situação ainda mais caótica do que a atual.

Só restará realmente aos cariocas apelar ao Cristo. Ao Redentor que, firme como uma rocha, nunca os deixará.

sexta-feira, 13 de novembro de 2020

O CIRCO TRÁGICO

O CIRCO TRÁGICO




Conduzir nossos veículos pelas ruas e avenidas das grandes cidades do Brasil atualmente é presenciar a cada semáforo e a cada esquina um verdadeiro espetáculo circense ao ar livre. No entanto, não nos traz alegria assistir tais apresentações à céu aberto, longe da lona protetora dos circos. A tragédia é verdadeira essência destes personagens de rua metropolitanos.

É de se perder de conta o número de malabaristas, engolidores de fogo, palhaços e outros artistas maltrapilhos que encontramos diariamente ao circularmos pelas metrópoles brasileiras. Tais ocorrências pouco variam de cidade para cidade.

A primeira impressão que se tem é de que as ruas se tornaram um refúgio para todo tipo de artistas circenses desempregados. Porém, a realidade é muito mais cruel e trágica.

Não há nada de engraçado no fato de vermos nossas crianças, jovens e, até mesmo, idosos, se sujeitando a fazer palhaçadas em troca de uma moeda, uma migalha de nossas vidas privilegiadas.

Quantos palhaços nas esquinas do Brasil, por trás de sua maquiagem ocultam não um sorriso, mas a tristeza e muitas lágrimas?

Tais pessoas lutam para sobreviver, para terem o que comer, para levarem para seus familiares e amigos uma pequena dose de esperança, acreditando num amanhã melhor e num futuro menos incerto.

Crianças tão pequenas que mal as conseguimos ver na frente de nossos carros, fazendo malabarismo, se arriscando no meio do caótico trânsito da cidade. Podendo ser atropeladas a qualquer segundo, longe das escolas, de um prato de comida, sem expectativa de uma vida mais digna.

Homens e mulheres que poderiam ter uma profissão, um emprego, escola para seus filhos, hospitais nos quais pudessem se tratar, todos abandonados pelas ruas pois não tem qualificações mínimas para conseguirem empregos. Sequer possuem um domicílio fixo, um pequeno lar que possam chamar de seu.

Todos fazendo acrobacias com bolas que voam pelo ar. Elas parecem representar o futuro deles, pois ninguém sabe onde cairão, se as conseguirão alcançar ou até quando aguentarão fazer tal esforço, repleto de incertezas.

Engolidores que, por falta do que comer, têm que se contentar com o fogo ou com lâminas de espadas.

Mágicos que conseguem fazer tudo desaparecer, exceto, a miséria em que se encontram.

Até quando seremos espectadores deste circo trágico? Quando iremos nos mobilizar para ajudarmos a dar oportunidades a todos os homens, mulheres e crianças que lutam tão arduamente para sobreviver mais um dia na floresta de aço, concreto e vidro de nossas grandes cidades?

Não podemos deixá-los abandonados e nos esquecer que também poderíamos estar do outro lado do para-brisa, como artistas frente à uma platéia indiferente.

sexta-feira, 30 de outubro de 2020

CHIQUEIROS PÚBLICOS

 CHIQUEIROS PÚBLICOS

 


Quando eu era criança, bem pequeno, aprendi uma lição extremamente importante, que ainda tenho em mente mesmo após tantos anos. Lugar de lixo é na lixeira!

Infelizmente, nos dias de hoje tal ensinamento parece ter sido quase que completamente esquecido.  Imagino que os pais, professores e outras pessoas mais velhas não estejam transmitindo tal mensagem para as novas gerações. Talvez os jovens de hoje não se importem com sujeira exposta por toda parte.  Porém, o que importa é que nossas ruas estão cada vez mais imundas, repletas de dejetos de todos os tipos.

O que mais me causa espanto é ver pessoas a bordo de seus veículos importados e blindados, de suas caminhonetes e utilitários, de suas super motos, muitos deles jogando fora latas de refrigerante ou cerveja, pontas de cigarro, papéis, embalagens de alimentos e todo tido de lixo em nossas ruas. Quem é que já não foi (ou quase foi) atingido por um petardo arremessado por tais motoristas irresponsáveis?

É inadmissível que alguém que conduza uma BMW ou Audi tenha tal atitude tão desrespeitosa! Alguém que tem dinheiro para possuir um veículo deste porte teve condições de estudar nos melhores colégios, de aprender boas maneiras, de ser devidamente socializado. Não há desculpa para tal desprezo para com o espaço público e com os bens de toda a sociedade. As ruas são de todos, assim com as praças, os parques, os monumentos, as praias, enfim, todos existem para serem usados pelo povo, que tem a obrigação de mantê-los limpos para o bem-estar da comunidade.

O fato de um indivíduo ter uma situação financeira privilegiada não significa que necessariamente será mais bem-educado ou mais respeitoso com os bens e espaços públicos. Todos nós já vimos pessoas humildes, pobres ou até mesmo mendigos, jogando lixo nas lixeiras. Nem todos que possuem contas bancárias bem recheadas tem a mesma atitude, mas deveriam ser os primeiros a respeitarem e a manterem nossas cidades limpas.

Porém, poucas coisas me causam tanto repúdio e nojo como as malditas feiras de rua. Os feirantes brasileiros atuam como verdadeiros seres predadores. Invadem um local público, interditam ruas, cobrem completamente as ruas com suas inúmeras barracas, fazem uma baderna absurda, enlouquecem os moradores vizinhos da feira com o barulho que fazem e, por fim, ao irem embora deixam um “presente” para toda a vizinhança: a rua completamente imunda, coberta de restos de alimentos e detritos.

O mais surpreendente de tudo é que a maior parte das feiras públicas tem o aval e autorização para funcionamento dado pelas prefeituras de nossas cidades, pois são fortemente influenciadas pela pressão das associações de feirantes, além dos casos em que propinas são recebidas para dar um status legal à tais chiqueiros públicos.

Quem tem a infelicidade de morar numa rua onde ocorre feiras semanais sabe exatamente do que estou falando. Não podem entrar ou sair de seus imóveis quando bem entendem, pois com as ruas interditadas, somente uma bicicleta consegue sair de uma garagem. Imagine todas as pessoas doentes, que precisam de repouso, descanso ou, até mesmo, precisam se dirigir imediatamente à um hospital em casos de emergência. Tais pessoas correm o risco de morrerem, pois uma ambulância jamais conseguirá passar por entre centenas de barracas de feiras e contornar outros tantos caminhões de frutas e verduras estacionados irregularmente nas cercanias.

Isso é mais uma faceta infeliz do cotidiano do brasileiro. Resultado de um governo absolutamente incompetente, em todas as esferas, e de um povo que não se mobiliza para exigir seus direitos. Os moradores de ruas “invadidas” tem todo o direito e a obrigação de apelarem à justiça, aos veículos de comunicação para expulsarem tais invasores de suas ruas, e lutarem pelo direito de ir e vir, de poderem entrar e sair de seus imóveis à qualquer hora, e não a terem de deixar seus veículos fora da garagem de véspera, para poderem sair de casa depois da chegada dos “invasores”.

Os lixeiros que limpam a imundície deixada pelos feirantes invasores são pagos por todos nós, cidadãos que pagamos nossos impostos. Por que devemos deixar nosso dinheiro ser usado para limpar a sujeira que pessoas irresponsáveis vem fazer bem longe de suas residências? Falta mais uma vez uma mobilização da sociedade brasileira para resolver essa e tantas outras questões que continuam ocorrendo no Brasil por causa de nosso conformismo e acomodação.

Nos calamos perante a esse e tantos outros absurdos. Portanto, damos nosso consentimento para perpetuá-los.

quinta-feira, 22 de outubro de 2020

OS KAMIKAZES DO ASFALTO

 OS KAMIKAZES DO ASFALTO




Eles surgem de toda parte, de lugares improváveis, inimagináveis. Num instante, você está à salvo, no outro, eles estão todos ao seu redor, deixando-o cercado, sem saída.

Não, não me refiro a nenhum inseto ou animal predador. Trata-se da mais nova praga urbana: os Kamikazes do asfalto.

Atualmente as maiores cidades do Brasil estão tomadas pelos motoboys, os mais novos predadores da selva urbana em que vivemos. Em lugares como São Paulo e Rio de Janeiro, é praticamente impossível sairmos pelas ruas sem nos depararmos com verdadeiros enxames deles, que se movem velozmente por entre carros e ônibus, desaparecendo tão rapidamente como surgiram.

Todo indivíduo com um mínimo de conhecimento da situação do desemprego no Brasil, sabe o quão difícil é para as pessoas menos qualificadas encontrar um emprego, por pior que ele seja.

A queda vertiginosa na qualidade do ensino, tanto público quanto privado, aliada à fatores como o crescimento populacional desordenado, aumento do desemprego, elevação do custo de vida nas metrópoles e as sucessivas crises econômicas do país criaram um terreno fértil para o surgimento desta até então desconhecida profissão: o motoboy.

Milhares de homens e mulheres encontraram nela uma forma de conseguirem o seu sustento, assim como o de seus familiares. No entanto, a forma com que isso ocorreu é que ocasionou o surgimento de um enorme problema social.

A grande maioria destes indivíduos tem baixíssimo nível educacional e se encontram em situação desesperadora, sendo capazes de tudo para tentar sobreviver. Até mesmo arriscando suas próprias vidas e a de todos ao seu redor.

Ao se tornarem motoboys, encontram uma forma para ganharem algum dinheiro. Porém, devido ao baixo valor de sua remuneração, decidem trabalhar o máximo que podem, a fim de aumentar sua renda mensal.

Tal busca desenfreada é geradora de grandes tragédias. A grande maioria dos motoboys não possui carteira de habilitação para condução de motos, nunca fez nenhum curso de preparação para conduzi-las e, o pior de tudo, não respeita qualquer lei de trânsito existente, as violando sistematicamente a cada dia.

Diariamente, dezenas de pessoas morrem em todo o país devido aos acidentes envolvendo motoboys. Muitas pessoas são atropeladas por eles, ao atravessarem as ruas de nossas cidades, pois a grande maioria dos motoboys desrespeita e ignora os semáforos vermelhos, assim como praticamente todas as leis de trânsito vigentes.

Também não respeitam as faixas de pedestres, avançando em cima dos pedestres que ousam atravessá-las em sua frente.

Arrancam espelhos retrovisores dos veículos parados, pelo simples fato de ali estarem e, segundo a lógica insana dos motoboys, estarem bloqueando a passagem de seus bólidos por entre minúsculas frestas entre as fileiras de automóveis.

Pobre dos que ousam reclamar dos vândalos sobre duas rodas. Na melhor das hipóteses, são agredidos verbalmente ou até mesmo fisicamente por estes indivíduos. Muitas vezes, motoristas tem seus veículos chutados, arranhados e danificados por enxames de motoboys ensandecidos, sem que a polícia faça qualquer coisa para puni-los e proteger os cidadãos inocentes que estão dentro de seus carros, respeitando as leis de trânsito.

Tal conflito diário gera inúmeras vítimas fatais, tanto motoboys quanto transeuntes e motoristas de carros. Todos lembram da morte trágica de Marcelo Frommer, guitarrista do grupo Titãs, que foi atropelado por um motoboy que, covardemente, o deixou caído no chão, sem prestar qualquer tipo de socorro e o abandonou estirado, caído, até a morte. O que mudou desde então? Infelizmente, nada.

Me pergunto o porquê de os motoboys usarem capacetes. Me parece tão absurdo quanto os Kamikazes japoneses, que partiam para suas missões suicidas com capacetes em suas cabeças. Se todos já sabiam que iriam morrer em suas missões, pois eles mesmos cometiam o suicídio em nome de sua nação e de seu imperador, por que usar capacetes?

Isto se aplica aos Kamikazes urbanos também. Porque usar capacete, visto que agem como suicidas, conduzindo suas motos acima da velocidade permitida, avançando sobre semáforos vermelhos, acelerando suas motos pelas calçadas, andando pela contramão, fazendo ultrapassagens perigosíssimas. Qual é a finalidade do capacete nestas situações? Quem é suicida não precisa de tal acessório.

Lamento que as autoridades brasileiras se omitam completamente em tais situações e deixem os cidadãos totalmente abandonados à mercê de incontáveis infratores que ignoram todas as leis de trânsito e que são responsáveis por milhares de mortes e acidentes que ocorrem todos os anos no Brasil.

Portanto, caro leitor(a), muito cuidado ao sair pelas ruas de sua cidade, pois ninguém sabe onde ou quando ocorrerá o próximo ataque dos Kamikazes do asfalto. Muita atenção, pois nunca se sabe quem será a próxima vítima...

segunda-feira, 5 de outubro de 2020

ENVELHECER: CRIME INAFIANÇÁVEL

 


ENVELHECER: CRIME INAFIANÇÁVEL

Atualmente, no país da efemeridade, inconsistência e de total inversão de valores, vulgo Brasil, o que vale não é o que você é ou sabe. O maior patrimônio que uma pessoa pode ter é sua aparência.

É perfeitamente normal e aceitável que nossa aparência física exerça um papel importante em nossas vidas. No entanto, em nosso país, tal fato tornou-se tão desproporcionalmente mais importante que todo o resto parece não mais ter qualquer significância.

Já que a cultura, o conhecimento, o estudo, o trabalho e outras facetas de um indivíduo não tem qualquer valor em nossa decadente sociedade, o que realmente conta é a embalagem. Dane-se o que vier dentro!

Tal fenômeno, merecedor de uma profunda análise psicológica, antropológica e sociológica, é ainda mais acentuado no universo feminino brasileiro.

Há uma verdadeira guerra não declarada em curso no mundo das mulheres do Brasil. Muitas delas lutando para se tornarem mais lindas, conservadas e joviais do que todas as outras. Trata-se de uma situação, no mínimo, bizarra.

Tudo isso ocorre em nome de uma guerra contra o tempo, impossível de ser vencida. O tempo é implacável e passa para todos. Não há mal nenhum nisso. Não é crime nenhum envelhecer, embora um olhar mais atento pelas entranhas de nossa sociedade possa nos levar à uma conclusão diferente.

O Brasil está entre os maiores do mundo no tocante ao número de cirurgias plásticas executadas anualmente, em tratamentos estéticos, aplicações de Botox, lipoaspirações, aplicações de silicone em todas as partes do corpo e em qualquer outro ponto relacionado à estética e beleza.

Praticamente ninguém mais se preocupa em ser. O que vale é nossa aparência.

Vivemos numa sociedade onde não há mais espaço para o velho, para o que é antigo, o idoso. Rugas, cabelos brancos, carecas, pés de galinha, e quaisquer outros sinais normais de envelhecimento são considerados provas de um crime inafiançável: o de envelhecer.

Basta irmos a qualquer shopping center do país para vermos mães que usam os mesmos modelos de roupa que suas filhas. Isso é normal?

No desespero de se “vencer” a luta contra a velhice, nós brasileiros criativos inventamos a cirurgia plástica em prestações e o Botox pré-datado. Qual será a próxima invenção?

Considero importante que todos nós cuidemos de nossos corpos, sem qualquer fanatismo, mas que aceitemos o fato de que o tempo passa, e que nós naturalmente envelhecemos. É o ciclo da vida. É a nossa natureza. Tudo passa, inclusive nós.

No dia em que aceitarmos isso teremos muito mais paz e seremos mais felizes, aproveitando plenamente a vida, sem corrermos o risco de, ao nos olharmos ao espelho, não nos reconhecermos mais.


segunda-feira, 21 de setembro de 2020

PELADA NA VÁRZEA

 PELADA NA VÁRZEA

  




Boa noite caros telespectadores! Bem-vindos ao duelo desta noite: o brasileiro versus a incompetência do governo! Este promete ser um jogo duríssimo!

O brasileiro entra otimista em campo. Tem confiança de conseguirá embarcar ainda hoje em seu voo para a extremidade oposta do país.  O governo está disposto a fazer de tudo para impedi-lo, e é extremamente competente nisso. Todos os adversários do governo reconhecem sua infinita capacidade de sorver todos os recursos de seus oponentes, deixando-os sem energia para enfrentá-lo.

Começa o jogo. O brasileiro pega a bola, o governo vem e entra duríssimo, na canela e sai correndo e, como não tem nenhum escrúpulo mesmo, considera a jogada normal e prossegue.

A situação começa a ficar difícil para o brasileiro, pois o governo demonstra que as regras do jogo só se aplicam ao brasileiro, não para si, pois ele tem foro especial e privilegiado em Brasília.

Como sempre, correndo atrás do prejuízo que lhe é imposto pelo governo, o brasileiro corre atrás da bola e consegue tomá-la do governo, já que ele é extremamente lento e burocrático ao correr.

Feliz da vida, o brasileiro parte velozmente em direção ao saguão principal do aeroporto. A torcida está toda a favor do brasileiro, mas não o demonstra, afinal, o povo daqui só lembra que é brasileiro durante a copa do mundo, não em um jogo sem qualquer glamour como este.

Mesmo sem o apoio da torcida, silenciosa devido à apatia e acomodação que lhe são peculiares, o brasileiro consegue passar driblar os motoristas de táxis que tentam bloquear sua passagem, oferecendo preço fechado na bandeirada deles por apenas R$200,00.

O brasileiro entra na área do adversário, porém, fica desorientado, pois não consegue tocar sua bagagem até o check in. Há uma multidão de pessoas por lá, todas revoltadas. Reclamam, mas ninguém faz algo de concreto. Um esporte nacional realmente popular: ficar horas esperando em filas, reclamando, não fazer nada à respeito disso e, depois de atendido, ir embora e se esquecer de tudo.

Depois de muitos dribles e de mostrar toda sua ginga, o brasileiro consegue fazer o check in, não antes de ser confundido novamente pelas informações contraditórias dos funcionários da companhia aérea e ser tratado com a mesma cordialidade dos garçons franceses.

Porém, o governo, apesar de sua morosidade e incompetência, possui aliados por toda parte, que tentam de toda forma dificultar a vida do brasileiro e impedir sua viagem.

Portões são abertos e fechados, informações contraditórias nos painéis, todo tipo de artifício é usado para desorientar o infeliz brasileiro.

Usando de suas últimas forças, o brasileiro dá um chapeuzinho no adversário em frente ao portão de embarque. Ufa! Consegue passar por mais um! Agora corre obstinadamente em direção ao embarque, onde uma barreira bloqueia sua visão. Mas o brasileiro realmente está decidido a embarcar neste voo.

Dá um chute em sua bagagem de mão e consegue colocá-la por cima da barreira. Agora só falta ele conseguir embarcar!!!

Cada vez mais confiante em sua habilidade de superar os obstáculos, o brasileiro faz uma finta, finge que vai e não vai e consegue driblar a barreira à sua frente. Já com o grito de gol na garganta, penetra a pequena área adversária e consegue entrar no avião. Milagre!! Seu assento não está ocupado por nenhum idiota analfabeto que não consegue ler o número de seu assento no bilhete!

Parece inacreditável, caros telespectadores, mas o brasileiro consegue sentar-se em sua poltrona e afivelar o cinto de segurança! 

Goooooooooooooooooooooool!!!!!, grita ele euforicamente.

Porém, logo em seguida, ele ouve a voz do comandante da aeronave falando num tom digno de “A Voz do Brasil”.

-Informamos aos srs. passageiros do voo Goooooooooooooooooool 123, com destino à Fimdomundópolis que não teremos como decolar. Está chovendo e faltando eletricidade na cidade. O aeroporco de Pamonhas está fechado por sua pista não estar preparada para dias chuvosos.

Pedimos a gentileza que o povo brasileiro engula mais esse sapo e volte amanhã às 4 horas da manhã para pegar uma senha para o reembarque, provavelmente lá pelo final da tarde, se a chuva tiver parado e os controladores de voo não estiverem mais em greve.

Este realmente não é um país sério. 

segunda-feira, 7 de setembro de 2020

 EXTORSÃO CONSENTIDA










Todos os brasileiros sabem que nossas ruas e calçadas são imundas, cheias de dejetos e lixo por toda parte. No entanto, um outro indício da completa crise social que vivemos é a onipresença dos flanelinhas.

Há algum tempo não havia ninguém nos importunando quando estacionávamos nossos veículos pelas ruas de nossas cidades. Porém, com o empobrecimento acentuado e contínuo do povo brasileiro nas últimas décadas, começaram a aparecer indivíduos, inicialmente inofensivos, que pediam humildemente uma moeda, qualquer trocado que tivéssemos nos bolsos, a fim de ajudá-los. Ofereciam limpar nossos carros com flanelas imundas que carregavam consigo. Muita gente também contribuía somente para manter tais flanelas longe de seus veículos.

Nascia aí uma nova figura na sociedade brasileira: o flanelinha.

Até hoje me questiono se tal nome foi dado pelo povo por causa das pequenas flanelas carregadas por tais indivíduos ou foi um apelido carinhoso que lhes foi dado, já que nós brasileiros costumamos fazer uso dos sufixos “inho” ou “inha” nessas situações. Seja qual for a resposta, tal personagem já faz parte de qualquer área metropolitana brasileira

Sentindo pena, muitas pessoas contribuíam, pois acreditavam que estavam realmente ajudando tais pessoas e que, de tal forma, sanariam um problema social ignorado pelo governo e pela sociedade brasileira, de uma forma geral.

Com o passar dos anos, e o aumento contínuo da violência e dos roubos de veículos, tais pedintes começaram a oferecer “segurança” para seus “clientes”. Diziam que, se lhes fosse dado algum trocado, ficariam observando o veículo de seu “cliente” para evitar que ele fosse roubado, “assegurando”, portanto, que, ao retornar, o “cliente” não teria surpresas desagradáveis.

Ao invés de cobrar e exigir dos governantes que houvesse segurança nas ruas e em toda parte, o povo brasileiro, que não gosta de se aborrecer e é acomodado, acabou aceitando o caminho “mais fácil”, concordando em pagar por tal segurança que, de fato, já era paga por ele através de seus impostos, continuamente desperdiçados por nossos governantes , através de falcatruas, corrupção e outros fins escusos.

Tal processo foi se acelerando, e logo, os flanelinhas já se consideravam “autoridades”, começando a usar coletes coloridos que lhes conferiam uma pseudo-autoridade, como se fossem guardas de trânsito ou até mesmo funcionários responsáveis pela segurança pública.

A forma de cobrança também mudou. Passou a ser antecipada, com valores que variavam de acordo com o veículo do “cliente” e da “boa aparência” do mesmo. Alguns pagavam R$1, outros, R$5 e alguns, até mesmo R$10 para terem a “segurança” de não terem seus carros roubados, arranhados, pneus furados e vários outros tipos de problemas. Eu mesmo já passei várias vezes por tal situação, por recusar-me terminantemente a dar qualquer tipo de gorjeta para qualquer pessoa que venha pedir-me dinheiro para “vigiar” o meu carro.

Atualmente, nossas ruas são verdadeiras selvas, nas quais tais flanelinhas atuam como animais selvagens, demarcando seus territórios, brigando entre si para “conquistarem” áreas privilegiadas, onde as gorjetas são melhores, garantidas e que ocorrem durante o dia todo.

Há um verdadeiro loteamento em curso de nossas calçadas e ruas sem que ninguém, absolutamente ninguém faça nada para acabar com tal aberração. Pelo contrário, o povo brasileiro continua aceitando docilmente mais um desrespeito aos seus direitos, uma violação acintosa à qual somos submetidos e que consideramos absolutamente normal.

Quanta gente não acaba “contribuindo” com tais nefastos flanelinhas por terem medo de serem agredidos ou até mesmo roubados por eles? Tal situação continua ocorrendo pois nós, cidadãos brasileiros não nos mobilizamos e exigimos a retirada de todos os flanelinhas de nossas ruas e nos recusamos a sermos extorquidos por tais indivíduos.

Somente quando o povo brasileiro começar a exigir o respeito aos seus direitos, em todos os níveis e esferas, é que teremos paz.

Enquanto isso, continuaremos sendo extorquidos a cada esquina, indefesos, dóceis como uma ovelhas que, ingenuamente, caminham rumo ao matadouro.

terça-feira, 1 de setembro de 2020

 UM CONCEITO ULTRAPASSADO








Existe uma questão que desperta discussões acaloradas onde quer que seja abordada. Alguns o defendem ardorosamente. Outros, o atacam de forma impiedosa. Sim, o serviço militar obrigatório no Brasil ainda é assunto controverso.

O fato de todo homem brasileiro ser obrigado a se alistar para o serviço militar ao completar 18 anos é sinal de um país que ainda não foi capaz de se libertar das amarras históricas do passado, e que continua dando passos miúdos à uma verdadeira e ampla democratização do país.

Tal instituto foi instaurado em nosso país (pasmem!) na época das Capitanias Hereditárias, em 1542, quando a população local necessitava se organizar para defender-se dos índios rebeldes ao domínio português.

Vários séculos depois, em 1915, foi defendido apaixonadamente pelo escritor Olavo Bilac, que considerava tal obrigação uma demonstração de amor à pátria.

Durante todo o século XX, foi instrumento usado pelo governo federal para assegurar que nosso país teria condições de se defender de uma invasão estrangeira. Havia na época um grande temor em meio às forças armadas brasileiras de que a Argentina pudesse nos atacar e tentar anexar os estados brasileiros da região sul a seu território.

De tal temor, surgiu a decisão de serem criados inúmeros quartéis e bases militares por toda o sul do país, especialmente em regiões fronteiriças e no Rio Grande do Sul, cercado por “inimigos” em potencial.

Em 1964, em pleno início da ditadura militar, foi aprovada finalmente a lei que regulamentou o serviço militar obrigatório, no modelo atual, vigente até os dias de hoje. Desta época até nosso dias, muita coisa mudou no país e no mundo. Voltamos a ser uma democracia, houve a criação do Mercosul, no qual a Argentina é o nosso principal parceiro, e a ameaça comunista (tão temida por nossos governantes) deixou de existir após a queda do muro de Berlim.

Atualmente, o serviço militar obrigatório não tem nenhuma razão para existir no Brasil. Muito poucas democracias no mundo ainda mantém tal instituto, como a Suíça e Israel. Ambos, países de dimensões territoriais muito pequenas e, no caso do primeiro, tal obrigação é usada para assegurar a capacidade de defesa e a manutenção da neutralidade do país. No caso do segundo, trata-se de uma questão de sobrevivência, pois Israel vive constantemente em guerra com seus vizinhos. Não nos enquadramos em nenhum destes dois casos. Até mesmo os EUA, país extremamente belicista e de dimensões continentais como o Brasil, não dispõe mais de tal dispositivo ultrapassado, pois o mesmo foi abolido após o fiasco da guerra do Vietnã.

No Brasil, desde a redemocratização, praticamente apenas as pessoas mais humildes, sem instrução, emprego ou qualquer tipo de qualificação continuam vendo o serviço militar obrigatório com bons olhos, pois vêem nele a possibilidade de ascensão social e de uma eventual estabilidade profissional. 

Nos pontos mais remotos e pobres do Brasil, há ainda grande disputa para ser selecionado para servir às Forças Armadas.

Todavia, tal obrigatoriedade é injusta e ultrapassada. Já chegou a hora do Brasil abolir definitivamente o serviço militar obrigatório e dar mais um passo firme em direção à democratização e desenvolvimento do país. Não podemos aceitar passivamente que tantos estudantes altamente preparados interrompam seus estudos e/ou trabalhos para passarem um ano de suas vidas pintando muros de quartéis, jogando futebol e manejando armamento que nunca usarão de fato, pois não há recursos para comprar munição. Para tais indivíduos, isto é uma enorme e irreparável perda de tempo.

Defendo a ideia de que seja voluntário o serviço militar no Brasil. Que os homens (e mulheres também) que desejarem ingressar ou prestar serviços às forças armadas nacionais, o façam de livre e espontânea vontade. Não pode haver qualquer tipo de punição aos que se recusarem a fazê-lo, como acontece atualmente, quando não se pode tornar funcionário público o homem que não tiver o certificado de reservista, além de outras sanções de todo tipo.

Desta forma, otimizaremos recursos humanos, pois apenas os indivíduos que tiverem vocação para tal e aqueles que realmente o desejarem se candidatarão ao serviço militar. Isso se refletirá numa redução nos custos de recrutamento, publicidade e manutenção de toda uma estrutura burocrática completamente ultrapassada, que necessita urgentemente ser revista e desmontada.

Por fim, não podemos nos esquecer que há muitos anos não são os países vizinhos que ameaçam dominar ou destruir o Brasil. As grandes ameaças e os maiores inimigos do país não se encontram fora de nosso território, e sim, dentro dele. Especialmente em Brasília.