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terça-feira, 17 de novembro de 2020

NÃO IMPORTA O DESTINO, ELAS ESTARÃO LÁ

 Não importa o destino, elas estarão lá.

 

Fui convidado a escrever sobre astronomia, não acerca de termos técnicos e teorias, mas sobre o interesse pelo tema e como isso poderia despertar algo em leitores não familiarizados com o assunto. Desde já, fica uma pergunta ao leitor: o que o leitor poderia querer ver no céu noturno? A lua? Marte? Saturno? Alguma constelação? Ou quem sabe a Estação Espacial Internacional (EEI), cruzando o céu noturno como um pequenino ponto de luz em alta velocidade?

Bom, minha curiosidade pela astronomia começou ainda criança, numa infância recheada de filmes e livros de ficção científica, e foi fomentada por pais que, ainda que não dominassem conceitos e teorias astronômicas, queriam atiçar a curiosidade dos seus filhos e incentivá-los ao mundo científico

Assim, ainda criança, meus pais presentearam a mim e a meus irmãos com um telescópio refrator (que nada mais é do que uma grande e potente luneta). É bem verdade que o presente impressionava mais do que era útil, dada minha impaciência e inexperiência quando o assunto era estudar cartas celestes e apontar o telescópio para o escuro e desconhecido céu noturno. Não demorou muito para o presente tornar-se uma bela peça decorativa.

Com o passar dos anos, porém, o aparelho começou a sentir o desgaste do tempo, até pelas inúmeras faxinas e descuidos nossos, e logo retornou à sua embalagem original, sendo relegado ao fundo do armário.

Porém, quase como um cometa, que de tempos em tempos nos visita, o telescópio retornou à ativa. Ele precisou aguardar o momento em que seria “redescoberto" por alguém.

Assim é que, e muitos anos depois de ter sido presenteado, o telescópio foi novamente montado e posicionado próximo a uma janela. A diferença era que, desta vez, eu sabia um pouco mais o que queria procurar e como poderia identificar o que eu estava procurando, apesar de, ainda assim, não saber onde o meu alvo estaria no céu.

Armado de uma paciência muito maior, insisti madrugada adentro até que, finalmente, consegui avistar Marte, o planeta vermelho. E, adivinhe só, ele é realmente vermelho! Naquele dia, ou melhor, naquela madrugada, meu espírito astronômico foi renovado.

Algum tempo depois, ainda com o mesmo equipamento, outra longa noite de observação permitiu-me localizar o planeta Júpiter, o maior planeta do Sistema Solar. Aliás, o leitor sabia que é possível observar Júpiter ao longo de várias noites diferentes e aprender, a partir dessas observações, a encontrar algumas de suas luas? (O autor encontrou apenas quatro, de um total estimado de 79).

Outro planeta que aquele velho telescópio foi capaz de me mostrar foi Vênus. Planeta gasoso bem próximo ao Sol, pode ser visto ao entardecer ou amanhecer como se fosse uma estrela bem forte próximo da linha de horizonte, no ponto em que o sol for nascer ou se por.

Entretanto, para mim, nada supera as noites de visualização de Saturno e a beleza de seus anéis. Na primeira noite em que consegui observá-lo o impacto foi tão grande que meus batimentos cardíacos aceleraram e precisei parar para respirar antes de continuar a observação.

Naquele momento, tudo o que havia aprendido até então, tudo o que foi lecionado na escola, o que documentários buscam esclarecer, o que a Ciência tenta há séculos falar, foi provado verdadeiro para mim.

Daquela noite em diante nunca mais olhei para o céu noturno da mesma maneira. Na realidade, nunca mais deixei de olhar para o céu. Sempre à procura da Lua, por estrelas e, quem sabe, por planetas que, um dia, sejam o nosso próximo destino!

Se o leitor pensa que é preciso começar desde criança, ou que é preciso investir em algum equipamento caro, está bem enganado. É possível usufruir de um dos maiores prazeres da humanidade, o turismo, e aproveitar para aprender um pouco mais sobre astronomia, se este for o desejo do leitor.

Apenas a título de exemplo, em países bem próximos do Brasil, há três localidades muito interessantes para observações astronômicas.

A primeira é bastante conhecida dos brasileiros. Trata-se do Chile, onde, entre diversos pontos turísticos, localiza-se o Deserto do Atacama.

O local é tão seco e isolado que é considerado um ambiente único para a astronomia. Não é à toa que, ali, podemos encontrar diversos passeios voltados à observação astronômica.

Um deles é a visitação a propriedades/sítios particulares, que contam com telescópios e instrutores. Esses passeios são pagos, mas valem muito a pena para aqueles que anseiam ver algo no céu noturno, como constelações e galáxias distantes.

Outro passeio é a visitação pública ao ALMA, um projeto internacional de radiotelescópios localizado justamente na região do Atacama. A visitação, porém, não é noturna, mas pode aumentar o interesse ou curiosidade dos visitantes sobre o tema.

A segunda localidade, muito próxima da primeira e cuja visita normalmente é feita a partir do Atacama, é o Deserto de Sal da Bolívia, conhecido como Salar de Uyuni. Em que pese não exista infraestrutura ou passeios turísticos destinados à observação astronômica, o passeio ao deserto de sal, em especial nas últimas horas da madrugada, propicia uma vista a olha nu impressionante.

É possível ver, sem a ajuda de aparelhos, um dos braços de nossa galáxia. Uma quantidade tão grande de estrelas e poeira cósmica que parece formar um rio estrelar, chegando a iluminar o horizonte mesmo sem luz solar (aqui cabe um pequeno trocadilho: à noite não falta propriamente luz “solar", uma vez que as estrelas que vemos são sóis como o nosso Sol).



                                        Foto de Clara Markovitz - Space.com


Outro local que permite algum tipo de observação astronômica é o Equador. Ainda que não possua nenhuma atração específica sobre astronomia, a geografia do país (muitas montanhas e vulcões) e a posição sob a linha do equador permitem que alguns poucos particulares “aluguem" seus telescópios às noites, nas cheias ruas do centro histórico da cidade de Quito.

É muito interessante e curioso encontrar telescópios à espera de clientes, dividindo espaço com turistas, músicos, artistas e comidas de rua. Obviamente, a observação depende da quantidade de nuvens no céu noturno, da qualidade do equipamento e da experiência da pessoa que disponibiliza esse serviço, mas ao custo de cerca de um dólar norte americano (no ano de 2017), é possível arriscar e, quem sabe, surpreender-se com uma “vista" inesperada naquele país!

O leitor poderia argumentar: “não estou disposto a comprar um aparelho que não sei utilizar” ou não quero viajar para um desses três países.

Sem problemas! Hoje mais do que nunca a tecnologia permite transformar a astronomia em algo que nos acompanha todos os dias e que cabe em nossos bolsos: o nosso celular.

Existem diversos aplicativos de celular que utilizam o GPS (e, em alguns modelos mais completos, o giroscópio do aparelho) para ajudar a localizar objetos celestes, como planetas, estrelas, constelações etc. Para tanto, basta movimentar o aparelho com o app ligado e observar as indicações na tela. Alguns exemplos de apps são: Carta Celeste, Sky View e Sky Map.

E é importante lembrar: a astronomia tem mais relação com o costume de olhar para cima do que, de fato, com o conhecimento científico profundo que esperamos de astrônomos e astrofísicos.

Antes de terminar, caso o leitor esteja curioso quanto a que fim levou o meu telescópio: após um ano de boas observações em 2020, o equipamento voltou para a caixa, agora para uma provável aposentadoria definitiva após pouco mais de 20 anos de trabalho. A baixa qualidade das lentes já não permite as mesmas observações e o equipamento possui mais um valor sentimental do que prático.

Deixo aqui o meu convite ao leitor para, quem sabe, permitir-se despertar uma certa curiosidade pelo tema da astronomia e levá-la aonde for, inclusive em suas próximas viagens. Afinal, não importa para onde o leitor vá, as estrelas estarão lá.

Por fim, caso o leitor queira uma pequena dica para começar a olhar o céu noturno, aqui vai uma: sempre que encontrar um ponto luminoso, olhe fixamente e veja se ele costuma piscar rapidamente, ou “cintilar”. Se sim, é muito provável que se esteja olhando para uma estrela. Se não, provavelmente o leito encontrou um planeta. Resta a ele descobrir qual.


                                            Vênus observado ao amanhecer no Sala de Uyuni

                                            Arquivo pessoal do autor


Marcelo Frost Marchesan é advogado, estudante de tecnologia da informação, amante de viagens e um entusiasta da astronomia.

Novembro de 2020.


segunda-feira, 12 de outubro de 2020

AS BRUMAS OURO-PRETANAS

           O Meio Ambiente e as brumas ouro-pretanas

 


Foto de Thiago Perilo




O ano de 2020 tem sido peculiar, difícil, desafiador para todos. Tem sido um ano de muitos acontecimentos. Ansiedade, dor, insegurança e medo à flor da pele. As dificuldades, antes de ganharem as nossas casas, tomaram conta do cenário político, econômico, cultural. Poucos países e poucos setores da economia se safaram desta onda de instabilidade chamada “2020”. Tem sido também em 2020 que soubemos que muitos não acreditam na Ciência, nas pesquisas acadêmicas, nos esforços dos intelectuais e cientistas. Será esse o começo do nosso fim? Ou a salvação está nas cavernas neandertais?

No entanto, minha opinião é que a questão ambiental é, de longe, a que mais se destaca em 2020, e não é pelos melhores motivos...

A começar, a Pandemia do Covid-19 que tem parado o mundo, literalmente, é fruto de um desequilíbrio entre costumes humanos e a natureza. Pouco foi noticiado e consequentemente refletido sobre isso. A maioria dos especialistas se dedicaram (e eu entendo) em explicar a doença de maneira clínica. Era o que de fato interessa aos expectadores. Cidadãos e, especialmente, aos empresários. Sobre a origem da Pandemia e do vírus, foi resumida às especulações e às teorias da conspiração. Portanto, como poderemos evitar que isso volte a acontecer, num futuro (talvez próximo), com um outro vírus qualquer?

Outro triste destaque para o Meio Ambiente teve o Brasil como protagonista: o aumento dos desmatamentos e das queimadas nem nossos mais importantes biomas o Pantanal e a Amazônico. O que isso tem a ver com a Pandemia do Covid-19? Nada. Mas pode ter a ver com futuras pandemias, uma vez que, ainda desconhecemos a maior parte dos vírus e bactérias nessas regiões. E, pode ser que, conheçamos de um jeito negativo/ reativo.




As consequências no Brasil, desse desmonte ambiental (que também escala para a esfera regulatória), estão gravados nas mais elevadas temperaturas experimentadas no mês de setembro de 2020, na má qualidade do ar, no dia que virou noite na cidade de São Paulo por causa da fumaça vinda da Amazônia, nas chuvas torrenciais e irregulares, na estiagem prolongada... cada região do país vivencia essas consequências de um modo.




Amazônia, Pantanal, Chapada dos Veadeiros, Chapada Diamantina, até chegar no Parque Estadual do Itacolomi, em Ouro Preto. Esse é um dos caminhos percorridos pelas chamas.  As consequências ambientais das queimadas e desmatamentos, e como tudo isso vai interferir na nossa qualidade de vida, já sabemos ou ao menos imaginamos. Mas e as consequências turísticas?

Bom existem algumas... Existem as consequências óbvias, especialmente para as Chapadas, que são as próprias atrações turísticas. Os turistas vão para admirar e estar em contato com a natureza. Se a natureza não mais existe, os turistas não vão. Ponto.  Segue-se uma quebradeira de pousadas, hotéis, restaurantes, bares, funcionários do parque etc.

Mas este atual ataque ao Meio Ambiente esconde outras consequências ao turismo. Alguns fenômenos naturais, característicos de algumas cidades ou regiões, que viraram atrações turísticas podem simplesmente desaparecerem. As brumas, por exemplo, que não existem só no lugar imaginário de “Avalon”. Brumas são um tipo de nevoeiro que ocorre em regiões de elevada altitude, cercadas por montanhas vegetadas. É como se fosse um “caldeirão da bruxa” gigante. No estado de São Paulo, vemos (ainda) esse fenômeno em Paranapiacaba.




E as brumas ouro-pretanas? Ah as brumas ouro-pretanas! Elas dão um charme a mais à cidade que já é linda! Cria um cenário misterioso, pitoresco, bucólico. À medida que vai dançando pelas ladeiras, as brumas escondem alguns casarões, revelam outros, e seguem num balé cheio de frescor anuviado de fim de tarde. As pedras das ladeiras cintilam em um dia de bruma, como reflexo das luzes da cidade e da lua. Escurece mais cedo em um dia de bruma. É quase um convite da natureza ao recolhimento, à introspecção.

Estes pequenos espetáculos que despertam tanto, e tantas memórias em nós, podem estar ameaçados pelos impactos ao meio ambiente, decorrentes (ou acelerados) pelas ações humanas. Quero continuar apreciando a grandiosidade delicada de cada um deles: as brumas ouro-pretanas, os lagos azuis turquesa da Chapada dos Veadeiros, as rochas que parecem que foram esculpidas da Chapada Diamantina, e outros tantos que ainda vou conhecer... Por isso, agradeço a quem veio antes de mim, por preservar, e clamo aos meus contemporâneos, para defender o que ainda temos. Avante!

 

Emiliana Fonseca

Brasileira

Ouro-pretana

Engenheira Ambiental

Mestre em Energias Renováveis


2020

bruma

bru·ma

sf

1 Designação genérica da falta de claridade na atmosfera, causada por partículas carregadas pelo ar (poluição, poeira) ou por névoa fina, que comprometem a transparência atmosférica ou anulam totalmente a visibilidade; nevoeiro, neblina, névoa seca.

2 Cerração, especialmente no mar.

3 FIG Aquilo que impede a clareza de visão e/ou de entendimento: As brumas do ódio e da embriaguez deixaram-no cego a quaisquer apelos.

4 FIG Falta de clareza; incerteza, obscuridade, vagueza.

5 FIG Coisa antiga, que se perde no tempo; enigma, mistério, sombra: Vive mergulhado nas brumas do passado.

ETIMOLOGIA

lat bruma.

[Dicionário Michaelis]

quarta-feira, 23 de setembro de 2020

Independência ou Morte!

 Independência ou Morte, por Samanta M. Sampaio


Esta história só poderia ter acontecido mesmo durante essa pandemia. Estava eu ajudando meu filho com as atividades da escola, quando abrimos a aula gravada sobre o dia da independência do Brasil. Enquanto o vídeo rolava, meu assombro só crescia. A professora - muito dedicada e esforçada, admito com prazer - pôs-se a desfiar todos os mitos sobre os eventos referentes à data que eu, provavelmente mais ou menos da mesma idade do meu pequeno, ouvi na escola.
Desta feita, ficamos sabendo que D. Pedro era muito querido pelo povo brasileiro, e que por isso não seguiu com sua família quando ela decidiu abandonar o Brasil e voltar para Portugal. Também por isso, por esse afeto mútuo, ele decidiu dizer que ficaria com o povo tão amado, dando origem ao Dia do Fico. E que então, para defender os brasileiros - não se disse exatamente de que - ele subiu em seu cavalo, puxou a espada e proclamou “independência ou morte!!!”. Com direito a muitos pontos de exclamação, obviamente!
Quando eu ouvia estes mitos, há tantos anos atrás, o Brasil estava sob uma ditadura, o que forçosamente implica em dourar o passado do país e ocultar os defeitos daqueles que o formaram. É normal, faz-se isso desde que o mundo é mundo, ditadores são ditadores, releva-se. Mas fiquei a matutar alguns pontos que não consigo solucionar. Vejamos:
Ainda precisamos mesmo dourar a pílula para as crianças? Esta geração que hoje tem seus cinco ou seis anos já nasceu com o dedo indicador em riste - se não para nos corrigir, para tocar as telas onipresentes em suas vidas? Será que não os estamos subestimando?
A querida professora, que provavelmente teve uma vida simples, sem luxos, e uma formação deficitária - não podemos negar a baixa qualidade dos cursos de pedagogia no país, eu pessoalmente tenho experiência com eles - realmente acredita nas histórias que passou para as crianças ou foi orientada a ensiná-los assim?
Tenha sido iniciativa da professora ou da escola, por que contar mentiras em sala de aula? Eu acredito piamente na teoria de que às crianças basta responder suas perguntas com sinceridade e simplicidade e elas se darão por satisfeitas - sem necessidade de mentiras ou tratados sobre história e geopolítica, no caso.
Caso a professora ainda acredite nestas versões romanceadas da história do Brasil, o que lhe faltou? Pensamento crítico? Acesso aos fatos históricos? Tempo para pensar ou ler livros sobre o assunto? Interesse, puro e simples?
E estes últimos questionamentos me levaram a outros: o que mais, além de conteúdos escolares, ouvimos desde pequenos e nos esquecemos de questionar ou pôr à prova? Provavelmente, como parte do crescimento, todos nós, em algum momento, questionamos coisas básicas que eram dadas como verdades irrefutáveis na infância - a autoridade dos pais, os valores que eles tentaram nos passar, religião, política, visão de mundo, filosofias... mas não podemos esquecer que tudo faz parte de quem somos e de como nos posicionamos no mundo. Continuar acreditando que o mundo é como um romance histórico certamente vai nos decepcionar cedo ou tarde. Mas o mais importante é nunca deixar de questionar - tudo, toda informação que nos chega, todos os nossos pensamentos, nem que por ao menos um segundo. Esse exercício de pensar constantemente e analisar se continuamos no caminho que acreditamos ser o certo é o que nos faz humanos no melhor sentido da palavra.
É isso: pensar. Pensar e questionar é preciso. Isso sim significa independência - ou morte.


Samanta M. Sampaio é apaixonada por uma quantidade inacreditável de assuntos, que sempre a levam à sua paixão primordial: livros. Para entrar em contato, envie um e-mail para <pensarnaoeproibidoainda@gmail.com>.

terça-feira, 8 de setembro de 2020

Essa é a estréia da coluna "Autores Convidados". A autora do texto abaixo é Lizandra Soave, minha amiga pessoal e criadora do ótimo blog "Filmes Históricos" (http://filmeshistoricos.blogspot.com/).


Pioneiros do Cinema

O século XX estava só começando e com ele também nascia a sétima arte que encontrava, no entanto, dura resistência para ser reconhecida como tal logo nos primórdios de sua invenção. Mas aos poucos o cinema foi consolidando seu valor artístico e ocupando um espaço gigantesco no mundo do entretenimento.

O cinema não nasce em Hollywood, mas sim na Europa, mais precisamente na França. Na cidade de Lyon os irmãos Auguste e Louis Lumière vinham desenvolvendo e aprimorando uma invenção revolucionária, o cinematógrafo.

E o fascínio despertado por essa invenção rapidamente cresceu e se espalhou por todo o mundo depois que eles projetaram, em 1895, uma filmagem curta da saída dos funcionários da fábrica da família.

Eles fizeram diversas exibições públicas dos materiais registrados pelo aparelho, que até então se restringiam a cenas do cotidiano com poucos segundos de duração. E em uma dessas apresentações estava um gênio do entretenimento, o produtor teatral e ilusionista George Méliès, que imediatamente identificou o potencial daquela nova tecnologia caso ela fosse associada à arte da encenação.

Méliès rapidamente começou a fazer filmes curtos, já introduzindo alguns truques e técnicas de efeitos especiais unindo seu conhecimento em ilusionismo e elaboração de cenários.

Ao longo dos anos o estilo das obras foi se modificando, passando daquele modelo meio teatral para enredos mais sérios. O filme “O Assassinato do Duque de Guise”, de 1908, dirigido por Charles Le Bargy e André Calmettes, foi um marco dessa transformação. Ele reconstituía um evento histórico ocorrido no ano de 1588, quando o então rei da França, Henrique III, o último rei da casa de Valois, mandou assassinar seu rival, o Duque de Guise, por causa de uma mulher, a Marquesa de Noirmoutiers, ou Charlotte de Sauve.

As inspirações para os filmes eram geralmente fatos históricos, grandes obras da literatura, textos sagrados e poemas épicos. Sobre obras literárias, já começam a aparecer processos na justiça por direitos autorais.

A maioria dos filmes era em preto e branco, mas alguns apareceram em cores, o que era possível graças a uma técnica bem rudimentar de colorização à mão. Os filmes de Méliès, por exemplo, eram colorizados dessa maneira por ele e por sua esposa.

No Brasil quem começa a movimentar o mercado cinematográfico são imigrantes italianos. Inicialmente os filmes mostram cenas do tipo documentário, exibidas exclusivamente para elite, reconstituição de crimes, em seguida começam a trazer alguma narrativa passando para adaptações de obras literárias.

A seguir temos uma cronologia do desabrochar do cinema pelo mundo:

1895 – Em Lyon, os irmãos Lumière fazem a primeira projeção pública usando cinematógrafo da cena “A Saída dos Operários da Fábrica Lumière”.

1896 – Em Paris, Charles e Émile Pathé e outros irmãos criam a produtora de filmes Pathé Frères, que trazia o galo como logomarca.

1900 – O inglês James Williamson dirige o filme “Ataque a Uma Missão Chinesa”, de pouco mais de um minuto de duração, sobre o Levante dos Boxers, exibido na Inglaterra com enorme sucesso. O filme já começa a apresentar uma narrativa mais complexa e apresentada de uma forma inovadora.

1901 – Ferdinand Zecca dirige “A Conquista dos Ares”, com um minuto de duração, e aparece sobrevoando a cidade de Paris, utilizando um recurso de edição.

1901 - O francês George Méliès inicia seus experimentos cinematográficos com o filme “O Homem com a Cabeça de Borracha”, trazendo já o seu estilo que unia o fantástico ao macabro.

1902 – Méliès dirige uma reconstituição histórica da “Coroação do Rei Eduardo VII”,  da Inglaterra. Nesse mesmo ano ele dirige também  o emblemático “Viagem à Lua”, o épico cósmico de quatorze minutos, deixando aquela imagem icônica da lua com um rosto e um foguete enterrado em um de seus olhos.

1903 – O americano Edwin Porter lança o filme “A Vida de um Bombeiro Americano” e em seguida o filme “O Grande Roubo do Trem”, que viria a ser o primeiro faroeste americano.

1904 - George Méliès dirige “A Viagem Impossível”.

1907 – O canadense Sidney Olcott dirige a primeira versão de “Ben-Hur”, baseada no livro de Lew Wallace, e abriu um precedente para disputas por direitos autorais.

1908 – Fundação da Société Film d’Art, que já começa a elevar o cinema à categoria de arte de fato.

1908 - Charles Le Bargy e André Calmettes dirigem a reconstituição histórica “O Assassinato do Duque de Guise”.

1908 – No Brasil o imigrante italiano Francisco Marzullo dirige “Os Estranguladores”, baseado em fatos reais.

1909 – O francês Alfred Marchin dirige “O Moinho Maldito” para a Pathé Frères, com locação na Bélgica. O filme foi colorido à mão.

1910 – O influente diretor americano D. W. Griffith dirige “Na Velha Califórnia”.

1911 – Os italianos Francesco Bertolini, Adolfo Padovan e Giuseppe de Liguoro dirigem o primeiro longa-metragem italiano “L’Inferno” baseado no clássico A Divina Comédia, e Giovane Pastrone dirige o curta “A Queda de Troia”.

1913 - Também na Itália Mário Caserini dirige “Os Últimos Dias de Pompeia”.

1913 – O indiano D. G. Phalke  dirige o filme “O Rei Harishchandra”, dando início ao cinema na Índia, contando a história de um personagem do poema épico indiano Mahabharata.

1914 – Giovane Pastrone dirige o grandioso  “Cabiria” em parceria com o poeta também italiano Gabrielle D’Annunzio. A história se passa no período das Guerras Púnicas.

1915 - D. W. Griffith dirige o polêmico épico “O Nascimento de Uma Nação”, que se passa no contexto da Guerra Civil Americana.

1916 – Nos EUA, Scotsman Stuart Paton dirige o filme de ficção científica  “Vinte Mil Léguas Submarinas” baseado no romance de Júlio Verne.

1920 – O diretor alemão Robert Wiene dirige o influente “O Gabinete do Doutor Caligari”, inaugurando o cinema de horror e trazendo a influência do expressionismo alemão.

1922 – Seguindo no movimento expressionista, o alemão F. W. Murnau dirige “Nosferatu, uma Sinfonia do Horror”, baseado no livro Drácula, de Bram Stoker, de 1897.

1923 – O americano Cecil B. DeMille dirige “Os Dez Mandamentos”.

1925 – Outro americano, Fred Niblo, dirige a mais uma versão de “Ben-Hur”, dando início ao gênero “espada e sandália”.

1925 – O russo Sergei Eisenstein dirige o histórico “O Encouraçado Potemkin”.

1927 – O francês Abel Gance dirige o revolucionário “Napoleão”.

 

Essas foram apenas algumas das primeiras obras que pavimentaram o longo caminho que viria a ser explorado e percorrido pelas mentes criativas ávidas por dar vida a personagens, desenvolver novas técnicas, conceitos, paradigmas e principalmente contar novas  histórias para o deleite de um público absolutamente encantado pelo fascínio da sétima arte.

 

Fonte: “Tudo Sobre Cinema”, Philip Kemp (Editora Sextante)