quinta-feira, 4 de fevereiro de 2021

ASSUNÇÃO - MÃE DAS CIDADES

 

ASSUNÇÃO – MÃE DAS CIDADES

 



Algumas viagens acabam se tornando grandes e alegres surpresas. Um destino que se encaixa exatamente nessa categoria é Assunção, capital de nosso vizinho Paraguai.

Recentemente tive a oportunidade de revisitar tal país após 15 anos de minha visita anterior. Devo lhes relatar que o país sofreu uma grande melhoria nos últimos anos e que a cidade de Assunção atualmente é muito melhor e mais bem estruturada para o turismo do que quando a visitei anteriormente em 2004.

Além disso, há bairros novos sendo construídos, restaurantes e shopping centers de excelente padrão, além da saborosa culinária local e de um povo extremamente hospitaleiro e simpático com os turistas brasileiros.

A imagem que ficou desta minha recente visita foi a melhor possível. Fui muito bem tratado em todos os lugares que estive, não vi ninguém pedindo esmolas, não me senti inseguro em nenhum local que visitei e pude conhecer belos locais nesse destino tão pouco procurado pelos turistas brasileiros, que é a cidade de Assunção.

A palavra Paraguai, na linguagem guarani, significa “rio que desagua no mar”, o que corresponde à realidade, pois o Rio Paraguai, o mais importante do país, nasce no Mato Grosso e desagua na Argentina, na região do Rio de La Plata, próximo ao mar.

Na época que os espanhóis chegaram ao território que atualmente é conhecido como Paraguai, em 1515, a região era habitada pelos índios guaranis. No entanto, os espanhóis só se assentaram no local em 1537, quando foi efetivamente fundado um forte chamado Nuestra Señora de la Asunción, que posteriormente deu origem à cidade de Assunção, atual capital do Paraguai e sua maior cidade.

Assunção está localizada junto à baía de Assunção, na margem esquerda do Rio Paraguai, frente à confluência com o rio Pilcomayo. Do outro lado da margem do rio Paraguai é possível se ver a Argentina, cuja cidade fronteiriça mais próxima se chama Clorinda.

Por todo o período colonial, Assunção foi um importante centro de descanso e reaprovisionamento para aqueles que chegavam ao Rio da Prata vindos da Europa, atraídos pelo ouro e prata do Alto Peru.

Assunção tem o título de “Mãe das Cidades”, pois durante o período de domínio espanhol, de lá partiram várias expedições com o intuito de fundar outras cidade do cone sul-americano, entre elas, a própria cidade de Buenos Aires.

Durante um longo período, a Argentina e o Paraguai eram um só, tendo sido governados conjuntamente até 1620. Porém, quando a Argentina proclamou sua independência, logo em seguida, o Paraguai fez o mesmo, se separando da Argentina, através de sua declaração de independência em 14 de maio de 1811. Uma peculiaridade da independência do Paraguai é que, dentro a América Hispânica, ela foi a única que ocorreu pacificamente, pois os espanhóis se renderam aos rebeldes, tendo em vista que não teriam como resistir às tropas locais nem poderiam aguardar a chegada de reforços, que teriam de vir da região do Rio da Prata.

Harpa Paraguaia


Em 1865, Francisco Solano López, ditador do Paraguai, entrou em guerra contra o Brasil, Argentina e Uruguai, durante o período conhecido como “Guerra do Paraguai”, que durou até 1870 e deixou consequências trágicas para o país, que foi derrotado pela “Tríplice Aliança”, pois teve sua população masculina dizimada, seu território reduzido e seu país ocupado por tropas brasileiras até 1876.

Uma outra curiosidade sobre o Paraguai é que sua moeda, o Guarani, é a mais antiga ainda em circulação em todas as Américas.

Atualmente, Assunção tem aproximadamente 2,5 milhões de habitantes, de um total de 7 milhões de habitantes em todo o Paraguai.

Em termos turísticos, há muitos locais interessantes a serem visitados na capital do Paraguai. Eu recomendo uma visita de 3 dias, que será suficiente para que se conheça as principais atrações, que eu detalharei a seguir.

Palacio López


No centro da cidade de Assunção se encontram as construções históricas mais importantes. Você pode começar seu passeio em frente ao Palácio López, que foi criado e usado pelo ditador Solano López e, até os dias de hoje, é sede do governo Paraguaio e o local onde trabalha o Presidente do Paraguai. Não é possível visita-lo internamente, mas pode-se caminhar em volta do mesmo e tirarmos belas fotos do palácio, além de se ter a possibilidade de fazer uma caminhada pela Avenida Costanera, em frente ao Rio Paraguai. De lá, você pode ir caminhando até a Catedral de Assunção, uma linda construção em ótimo estado de preservação, para um momento de contemplação e oração.

Catedral de Assunção



Do outro lado da praça da Independência, onde se encontra a catedral, pode-se visitar o Cabildo, antiga prefeitura da cidade, que atualmente abriga um interessante centro cultural. A única ressalva é que, infelizmente, atualmente a praça da Independência se encontra tomada por uma ocupação de moradores que foram desabrigados com as cheias do Rio Paraguai e montaram pequenas casas de pranchas de madeira no meio da praça. Tal ocupação não é uma favela, nem oferece grandes riscos aos turistas, desde que você circule por lá apenas durante o dia, sem ficar exibindo objetos de valor. Eu mesmo cruzei tal ocupação para ir da Catedral ao Cabildo e não tive problema algum, nem senti medo, pois vi crianças brincando, mulheres conversando na calçada, ou seja, nada que me fez sentir ameaçado.

Cabildo


Outro destino imperdível é a Casa da Independência, que foi usada pelos conspiradores para planejarem a independência do Paraguai, e de onde partiram os rebeldes para fazerem a rendição do governo Espanhol, há poucas quadras dali. Nesta casa há uma excelente visita guiada, com um guia excepcional, além de ser muito gentil.

Casa de la Independencia


A Manzana de La Rivera também deve fazer parte de seu roteiro. Trata-se de um quarteirão antigo, preservado, onde se encontram aproximadamente 9 casas do período colonial, que abrigam atualmente um museu, com várias peças interessantes em exposição, além do museu oficial da Harpa do Paraguai, que é considerado o instrumento nacional, além de produzir um belíssimo som.

Manzana de la Rivera


Caso já esteja com fome, eu recomendo um almoço (ou jantar) no excelente Restaurante Bolsi. Lá comi uma das melhores carnes que já experimentei em toda minha vida. O local é agradabilíssimo e o atendimento é ótimo. Altamente recomendado, especialmente para aqueles que apreciam uma boa carne. Para acompanhar os deliciosos pratos servidos no Bolsi, experimente uma cerveja Pilsen, a mais popular do Paraguai, que é muito leve e refrescante.



Cerveja Pilsen



Restaurante Bolsi





Carnes saborosas no Restaurante Bolsi


Para aqueles que apreciam o turismo religioso, recomendo uma visita à Igreja de la Encarnacíon. Uma construção austera, em tijolos, muito imponente e surpreendentemente ampla por dentro. Além disso, há muitas capelas para serem visitadas e para se orar. Preste atenção apenas no acesso à igreja, pois no meu caso, a entrada principal estava fechada, e eu pude visita-la  por sua porta traseira, contatando a secretaria, na rua aos fundos da igreja.

Igreja de la Encarnación


Outro local imperdível, considerado por alguns como o mais belo de Assunção, é o Panteão dos Heróis. Nesse local encontram-se os restos mortais dos maiores heróis da história paraguaia. Há uma guarda de honra que fica a postos durante todo o horário de visitação do mesmo. Lá estão os restos de Solano López e de outras personalidades famosas do país.

Pantéon de los Heroes


Se estiver com vontade de fazer um lanche, do outro lado da rua onde se encontra o Panteão dos Heróis, se encontra uma loja da famosa rede de sorvetes, chamada Heladeria Doña Angela. Não deixe de experimentar o sorvete de doce de leite granizado. É simplesmente delicioso!

Heladeria Doña Angela


Na praça onde se encontra o Panteão há uma interessante feira de objetos típicos paraguaios, onde você poderá encontrar exemplares do Ñanduti, que é o artesanato mais belo e refinado produzido no país. Tal palavra na língua guarani significa “teia de aranha”, o que por si só já denota a complexidade e delicadeza de tais peças.

Artesanato Paraguaio


Ainda na região central você poderá visitar o Museu Ferroviário, que fica situado em frente à linda Praça Uruguaia. Esse museu era a antiga estação central ferroviária de Assunção. Quando o transporte por trens foi abandonado, o prédio foi transformado em museu, no qual se pode visitar antigos vagões que eram usados por passageiros em suas viagens pelo país.

Museu Ferroviário


Para finalizar seu passeio no centro de Assunção, vá tomar uma bebida ou até mesmo jantar no charmoso Bar San Roque, um local com muita tradição, que nos lembra os antigos cafés do Rio de Janeiro e São Paulo. Os pratos servidos são deliciosos e extremamente bem servidos.

Bar San Roque


No seu segundo dia na cidade, você poderá visitar outras regiões da cidade onde também há muitas atrações de interesse turístico. Se você gosta de futebol, não pode deixar de visitar a sede do CONMEBOL (Confederação Sul Americana de Futebol), próximo ao aeroporto internacional, no qual há um belo museu, que oferece visitas guiadas, com direito à muitas fotos segurando as taças dos torneios promovidos pela instituição.

Museu e Sede do CONMEBOL


Mais uma atração para aqueles que amam o futebol é o Estádio Defensores del Chaco, no qual são realizados todos os maiores eventos esportivos do país, além dos maiores show de rock e música pop de astros internacionais da música, como Paul McCartney, Bon Jovi e Duran Duran.

Estadio Defensores del Chaco


Para aqueles que apreciam o contato com a natureza, eu recomendo o tranquilo Parque da Saúde. Ele é muito belo, com uma ótima infraestrutura, além de ser totalmente coberto de árvores. Em alguns lugares, elas chegam até a forma pequenos túneis, criando sombras agradáveis para os dias de muito calor.

Parque de la Salud


Um local imperdível em Assunção, para aqueles que querem conhecer um lugar charmoso e agradável é o El Café de Acá, onde é servido o famoso (e delicioso) Bolo de Cuatro Leches. Há vários ambientes nos quais podemos saborear os deliciosos pratos e iguarias servidas por lá. É um local bastante romântico, que poderá ser uma ótima pedida para casais que estiverem visitando Assunção.

El Café de Acá



Bolo de Cuatro Leches no Café de Acá


Outra construção histórica de grande importância é a Igreja da la Trindad. Trata-se de uma belíssima construção em estilo arquitetônico espanhol, na qual todas as colunas e o teto interior são decorados com lindas pinturas. Vale muito conhecer tal igreja, que foi a minha favorita durante a minha visita à capital paraguaia.

Igreja de la Trinidad


Por fim, no seu terceiro dia em Assunção, não deixe de visitar o Museu do Barro, que é o mais famoso do país, no qual poderá conhecer o artesanato paraguaio, vendo lindas peças feitas de barro por habilidosos artesãos. O prédio do museu é moderno, com uma boa infraestrutura e uma coleção de peças muito interessante.

Museu do Barro


Aproveitando que já está na mesma região, vá ao melhor e maior shopping center do país, o Paseo La Galeria, na Avenida Santa Teresa. Lá você encontrará as maiores marcas, grifes e lojas para todos os tipos de bolso, além de cinemas e excelentes restaurantes, como o Lo de Osvaldo, além de muitos cafés.

Shopping Paseo la Galeria


Por fim, termine o seu dia com um inesquecível jantar no Asado Benitez, onde poderá saborear as melhores carnes paraguaias. Eu mesmo não me esquecerei tão cedo do Bife de Chorizo que comi lá. O atendimento é ótimo e os garçons são muito gentis.

Asados Benitez


Se você precisava de algum motivo para ir conhecer a capital do Paraguai, agora você já tem vários para não deixar de visitar essa simpática cidade que é Assunção, capital de nosso vizinho Paraguai.

Boa viagem!

 

 

Todas as fotos da matéria foram tiradas por Marco André Briones em junho de 2019.

Com agradecimentos especiais à Otávio Gabriel Briones e Thais Aveiro.

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quarta-feira, 3 de fevereiro de 2021

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terça-feira, 2 de fevereiro de 2021

VILA OPERÁRIA MARIA ZÉLIA

 

VILA OPERÁRIA MARIA ZÉLIA

 

Antiga farmácia - Atual sede do grupo XIX de teatro


Se pudéssemos escolher um local que representasse, em uma escala mínima, toda a riqueza histórica e cultural de nosso país, além da beleza de nosso patrimônio arquitetônico, mas que, por outro lado, evidenciasse o total descaso e abandono através dos quais tais elementos são vistos pelos nossos governos e sociedade, esse lugar poderia ser facilmente exemplificado pela Vila Operária Maria Zélia.

Para podermos entender a importância e o valor histórico do local é preciso voltarmos no tempo. Precisamente ao ano de 1912.

Fachada da Escola de Meninos


No início do século XX, o continente europeu presenciou o surgimento de inúmeras vilas operárias, criadas com o intuito de servir de residência para os operários que trabalhavam nas fábricas em países como Inglaterra, França, Bélgica e outros. Tais vilas eram quase que mini-cidades, com vários tipos de serviços disponíveis para os operários em que nelas residissem. Além disso, apresentavam condições de saneamento urbano muito superiores à maioria das residências comuns da época.

Em São Paulo, as vilas operárias acabariam se instalando em bairros como Mooca, Ipiranga, Bom Retiro e Brás, próximas às linhas ferroviárias e às indústrias de famílias como Matarazzo, Penteado e Crespi. A maior parte destas indústrias permaneceu em atividade até a década de 1980. No entanto, a primeira vila operária do Brasil foi criada no Belenzinho.

Fachada da Escola de Meninas


Foi justamente tendo todo esse cenário em mente que o médico e empresário carioca Jorge Street, que havia herdado as ações da Tecelagem de Juta São João em 1896 e fundado a Companhia Nacional de Tecidos de Juta em 1904, adquiriu o terreno para a construção de uma vila operária, ao lado da filial de sua fábrica no Belenzinho.

A fábrica de Jorge Street produzia sacarias para produtos agrícolas e empregava aproximadamente 2100 operários. O empresário tinha uma relação muito próxima com seus funcionários, pois acreditava muito no conceito de “justiça social”. Tinha por hábito visitar os operários em suas casas e estabelecer laços fortes com eles. Durante tais visitas, se deu conta das condições precárias em que a maior parte deles vivia. Tal constatação o levou a buscar uma solução para tal problema

Inspirado no modelo europeu, decidiu contratar um arquiteto de origem francesa, chamado Paul Pedraurrieux, para construir uma vila operária para os funcionários de sua fábrica e seus familiares. Street se envolveu pessoalmente com a execução de todos os projetos do terreno adquirido por ele.

Observador solitário


O projeto de Street previa a construção de 220 casas familiares, além de um dormitório para solteiros, uma escola para meninos e outra para meninas, uma creche, dois armazéns, um ambulatório, consultórios médicos e odontológicos, uma igreja, um salão de eventos, um açougue, um campo de futebol, um coreto, uma praça, uma farmácia, além de uma fábrica de sapatos. Além de possuir ótimas condições estruturais, os moradores da Vila também dispunham de serviços incomuns na época, tais como a cobrança de aluguel descontado diretamente dos salários, uma taxa de cobrança pelo uso de água e o acesso aos serviços do armazém, que vendia produtos com subsídios de 50%.

O critério utilizado para a separação de famílias entre os diversos tipos de habitação era o número de membros. Quanto maior fosse a família, maior a moradia. Os administradores da empresa também tinham direito à residências maiores. Havia casas de quatro tamanhos, variando entre 75 a 110 m2, além de seis tipos diferentes. Todas elas dispunham de água e esgoto encanados, o que podia ser considerado um luxo para a época, na qual grande parte dos trabalhadores morava em cortiços.

Casa em estilo arquitetônico original


Uma das grandes preocupações de Jorge Street era com as crianças. Por tal motivo é que ele estabeleceu que a educação na Vila Maria Zélia seria uma prioridade e seria gratuita para os moradores. Para atender à demanda dos filhos dos funcionários foram construídas três escolas: uma para meninos, outra para meninas e uma terceira que servia de creche e jardim de infância. Tais escolas eram consideradas como as melhores da região e também eram abertas aos moradores das ruas vizinhas da vila.

Dentro da creche as crianças recebiam roupas, alimentos, tomavam banho e recebiam o leite para beberem à noite em casa. Até os sete anos de idade, os tratamentos médicos e odontológicos eram gratuitos. Ao atingirem tal idade, elas passavam a estudar na escola e tinham aula com professores da rede oficial de ensino. Havia dois períodos de aulas: diurno e noturno. O período noturno era destinado às crianças que trabalhavam na fábrica de Street.

As crianças recebiam também medicamentos gratuitos, enquanto os adultos tinham o valor dos mesmos deduzidos de seus salários. Também eram promovidas festas, bailes, concertos musicais e jogos de futebol.

A vila operária começou a ser construída em 1912 e foi inaugurada em 1917. O arquiteto Paul Pedraurrieux conseguiu criar uma pequena vila europeia dentro do Belenzinho. A nova vila recebeu o nome de Maria Zélia em homenagem à filha de Jorge Street, que havia morrido de tuberculose dois anos antes da inauguração do empreendimento.

A inauguração da Vila Maria Zélia foi um grande acontecimento na cidade de São Paulo, contando com a presença de políticos, industriais e do então Cardeal Arcebispo de São Paulo, Dom Duarte Leopoldo e Silva, que foi o responsável pela missa inaugural. Na ocasião ele visitou e abençoou todas as partes da Vila, tendo sido seguido por uma grande multidão.

Antigo Colégio Manoel


Embora Jorge Street tenha obtido sucesso com sua fábrica, ele acabou acumulando dívidas e teve que vender o complexo em 1924, que foi adquirido pela família Scarpa que, por sua vez, o revendeu à família Guinle. Como os Guinle também tinham muitas dívidas com o governo federal, a fábrica e a vila acabaram sendo confiscadas pelo Instituto de Aposentadorias e Pensões do Industriários.

Um outro período marcante da Vila Maria Zélia se iniciou em 1935 e durou até 1937, quando Getúlio Vargas a transformou em presídio político durante o período do Estado Novo. Tal uso da vila se deu após a chamada “Intentona Comunista”. Chegaram a ser detidos 700 presos no local, a maior parte deles ligados ao Partido Comunista Brasileiro e também intelectuais que se opunham ao governo ditatorial de Vargas. Entre eles, foram detidos personagens ilustres, como o historiador Caio Prado Jr. Como grande parte dos presos políticos era composta de intelectuais, historiadores e acadêmicos, a vila passou a ser chamada de “Universidade Maria Zélia”.

Antigo Colégio de Meninos


Em 1939, dois anos após o presídio ter sido desativado, a fábrica foi reaberta pela Goodyear, que demoliu a fábrica de tecidos, a creche, o jardim de infância e 18 casas para que a fábrica pudesse ser ampliada. Os moradores da vila passaram a pagar aluguéis pelo uso dos imóveis e, em 1968, tiveram a oportunidade de comprá-los através do sistema do Banco Nacional de Habitação. A inauguração da fábrica Goodyear acabou de vez com o vínculo entre a vila e a fábrica, pois foi criado um muro que, até os dias de hoje, separa as duas partes.

A Vila Maria Zélia já teve vários moradores ilustres. Entre eles, aquele que tem seu nome mais ligado ao local é o comediante Mazzaropi, que registrou seu filme “O Corintiano”, de 1966, em uma casa ainda existente até hoje na Vila. Outros moradores famosos foram a jornalista Patrícia Galvão, conhecida como Pagu, além de Octávio Frias de Oliveira, fundador da Folha de São Paulo.

Casa na qual foi filmado o filme de Mazzaroppi


Todo o conjunto arquitetônico foi tombado em 1992. Das 220 casas originais, ainda restam 171. No entanto, a maior parte delas já teve suas fachadas e outras características originais alteradas por obras irregulares ou não autorizadas, embora ainda remetam à arquitetura original. Os prédios funcionais (escolas e armazéns), pertencem até hoje ao INSS, que tenta vendê-los a órgãos públicos por alegar não ter recursos para a restauração dos mesmos, se encontrando em total estado de abandono, completamente largados, sem qualquer manutenção ou cuidado. Existe até mesmo o risco destes imóveis desmoronarem, devido ao precário estado em que se encontram. A Igreja São José está em condições um pouco melhores, pois é administrada pela Paróquia de São José do Belém, que conseguiu fazer uma reforma no telhado da igreja e evitar que o mesmo desabasse.

Igreja São José


A escola das meninas já foi cenário de vários ensaios fotográficos, campanhas publicitárias e clipes musicais, pois como muitas árvores cresceram dentro do prédio, tal ocorrência inusitada acabou criando um cenário único e muito original, bastante apreciado por artistas e publicitários.

Antigo Colégio de Meninas


Dois dos imóveis pertencentes ao INSS são usados atualmente pela Companhia Teatral Grupo XIX, que apresenta suas peças no local e tem contribuído para atrair a atenção para preservação do patrimônio histórico e arquitetônico da Vila; e também pela Associação Cultural Maria Zélia, que organizou um Centro de Memória da Vila e também é responsável pela organização de festas juninas e do aniversário da vila, com o objetivo de angariar fundos para as restaurações necessárias.

Em todas as vezes que visitei a Vila Maria Zélia, fiquei impressionado pela originalidade do local e por sua beleza, ainda que esteja tão mal preservado. Seria muito importante que a sociedade e os governos municipais e estaduais se unissem para restaurar e valorizar um local tão importante para a história de São Paulo e do Brasil.

Se tiver a oportunidade de conhecê-la pessoalmente, não deixe de fazê-lo, pois terá a chance de presenciar uma parte pouco conhecida de nossa história que, se não for urgentemente restaurada, poderá desaparecer para sempre.

Para maiores informações, consulte o site oficial da Vila Operária Maria Zélia.

https://www.vilamariazelia.com.br/

 

Marco André Briones – pensarnaoeproibidoainda@gmail.com

Todas as fotos da matéria foram tiradas por Marco André Briones, em julho de 2017.

 

Bibliografia:

Vila Maria Zélia – Visões de uma vila operária em São Paulo, de Vanderlice de Souza Morangueira – USP (2006)

Wikipédia

Aos 100 anos, o tempo parou na Vila Maria Zélia, de Priscila Mengue – O Estado de São Paulo – 12 de maio de 2017.

Vila Maria Zélia, nostalgia e descaso na memória da cidade, de Marina Izidoro – Sampa Inesgotável

Vila Maria Zélia – São Paulo Antiga – saopauloantiga.com.br

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segunda-feira, 1 de fevereiro de 2021

SANTUÁRIO DO CARAÇA - CATAS ALTAS

 

SANTUÁRIO DO CARAÇA – CATAS ALTAS

 

“Nas minhas viagens, não vi colégio mais bem organizado. Fiquei satisfeitíssimo com o Caraça. Só o Caraça paga toda a viagem à Minas”

D. Pedro II, em seu diário, comentando suas viagens por Minas Gerais.

 



Uma torre de igreja bem ao longe, no meio do nada. Seria uma miragem? Essa é a visão que temos ao nos aproximarmos do Santuário do Caraça. À medida que nos aproximamos, começamos a ver toda a grandiosidade da obra, que se espalha em meio à uma linda reserva florestal. Desde o primeiro contato, o Caraça, como é mais conhecido, nos inspira e acalma, e também nos convida a meditar sobre a vida e os caminhos que nos conduziram até esse local tão belo e isolado.

Tive a oportunidade de conhecer o Caraça em dezembro de 2013 durante uma viagem que fiz com meu irmão por todo o circuito das cidades históricas de Minas Gerais. Sem dúvida alguma, o Caraça foi um dos lugares mais marcantes de todo o passeio.

Serra do Caraça


O Santuário do Caraça está situado entre os municípios de Santa Bárbara e Catas Altas, a 120 quilômetros de Belo Horizonte. O Caraça é uma enorme área de 11.000 hectares, que combina religião, história, natureza e cultura. Além disso, a área inclui uma grande reserva natural, o Parque Nacional do Caraça, além do complexo religioso. Atualmente, recebe mais de 70.000 visitantes ao ano.

A história do Santuário do Caraça se iniciou em torno de 1770, quando o Irmão Lourenço de Nossa Senhora comprou a sesmaria do Caraça, onde decidiu construir uma capela barroca dedicada à Nossa Senhora Mãe dos Homens e uma casa de hospedagem de peregrinos na região. Quatro anos depois, o Santuário do Caraça foi inaugurado para acolher peregrinos.

Jardins


O Irmão Lourenço faleceu com 95 anos, deixando sua fundação em herança ao rei D. João VI, que posteriormente entregou as terras à Congregação da Missão. O Irmão Lourenço foi sepultado dentro da capela que ele construiu, rezando para que Deus realizasse o seu sonho de ver o Caraça repleto de missionários. No entanto, eles só chegaram sete meses após sua morte, quando fundaram o Colégio do Caraça.

Com o passar dos anos, o local que foi originalmente construído para ser a hospedaria acabou se tornando o colégio para meninos, o que acabou dando origem à um dos mais tradicionais colégios do Brasil. Entre 1820 e 1868, estima-se que mais de 11.000 meninos tenham estudado ali, sob a orientação severa dos padres e professores.

Hospedaria

 

Em 1876, o Padre Cavelin demoliu a capela barroca e erigiu em seu lugar uma igreja em estilo neo-gótico. A igreja do Caraça foi a primeira do estilo no Brasil, tendo sido construída antes mesmo da famosa Catedral de Petrópolis, no Rio de Janeiro. A igreja Nossa Senhora Mãe dos Homens foi inaugurada em 1883 e é composta basicamente de materiais locais, tais como pedra-sabão, mármore e quartzito. Possui também lindos vitrais franceses do século XIX e um órgão de fole. Além disso, foi construída sem mão-de-obra escrava, pois foram basicamente imigrantes portugueses e espanhóis que a erigiram.

Vista do complexo


O Caraça atraiu a visita dos dois únicos Imperadores do Brasil. D. Pedro I esteve no local para se aconselhar com o padre Leandro Rebelo Peixoto e Castro, ilustre educador em Portugal. Já D. Pedro II visitou o Caraça a fim de conhecer a natureza local, o colégio e as montanhas mineiras. Até hoje há uma pedra no calçamento talhada com os dizeres “PII – 1881”, marcando o local onde o Imperador escorregou e caiu.

Pedra na qual D. Pedro II escorregou


Devido à rigorosidade do colégio do Caraça, o Imperador Dom Pedro I só foi saudado à noite na Igreja. Nem a figura mais importante do Brasil na época foi capaz de interromper as aulas do colégio que formou dois ex-presidentes (Artur Bernardes e Afonso Pena), 17 governadores do estado e mais de 100 deputados e senadores que fizeram história tanto no Brasil quanto em Minas Gerais.

O Caraça possui inúmeras relíquias religiosas. A mais importante é o corpo de um soldado romano martirizado, que traz o nome de São Pio Mártir. Seu corpo foi encontrado em Roma, na Catacumba de Santa Ciríaca. Seus ossos foram revestidos de cera e foi feito um altar especial, dentro do qual se vê seu corpo dentro de um relicário de madeira e vidro. Há também no local seis obras do grande mestre Ataíde, um dos maiores expoentes do barroco mineiro. Entre suas obras expostas no local, se encontra a sua versão da “Santa Ceia”.

N.S. das Graças na entrada da igreja


O incêndio de 28 de maio de 1968 deu um fim às atividades educacionais do colégio do Caraça. Após o incêndio de 1968, o antigo colégio foi parcialmente restaurado para abrigar o museu que abriga lembranças de tempos passados. Grande parte dos livros da biblioteca foram resgatados do incêndio e estão atualmente disponíveis na nova biblioteca, situada acima do museu. A biblioteca possui um acervo de mais de 1400 livros dos séculos XVI, XVII e XVIII. No entanto, o Caraça nunca mais retomou suas atividades de seminário ou escola.

Os peregrinos que visitam o Caraça podem conhecer uma “Via Crucis”, existente no local, onde encontramos lindas esculturas de Jesus crucificado, Maria e São João. Podemos também visitar as catacumbas, onde estão enterrados os religiosos que moraram no Caraça, assim como alguns alunos ilustres.

Via Crucis


O Caraça também está associado à uma triste lembrança, a do acidente aéreo que ocorreu em 1982, quando um avião caiu na Serra do Caraça, matando todos os seus passageiros e tripulantes. Seus destroços se encontram até hoje no local, em meio à mata fechada.

Em 1982, o irmão Thomas começou a deixar no adro da igreja uma vasilha com carne para os lobos guará da região, que viviam remexendo o lixo e atacando os galinheiros. Os lobos gostaram do “presente” e passaram a visitar o local diariamente, sempre em torno das 18:30h. As visitas dos lobos guará se tornaram uma tradição do local, atraindo muitos turistas que esperam ansiosamente a chegada dos lobos para vê-los de perto e fazerem muitas fotos, pois os animais parecem não se incomodar com a presença dos humanos nem dos flashes das câmeras e celulares.

Entrada principal


Atualmente, podemos conhecer o Caraça como turistas, passando o dia no local, conhecendo todas as suas belezas naturais e arquitetônicas ou até mesmo como hóspedes, dormindo no hotel situado ao lado do santuário. O restaurante do hotel oferece refeições comunitárias e é muito procurado também pelos turistas. Muitos visitantes aproveitam o passeio para visitar a “Cascatinha” e a “Cascatona”, ambas dentro da área da reserva florestal. É necessário seguir uma trilha pela floresta até que se possa alcançá-las. A fauna e flora locais são muito ricas, permitindo que se possa descobrir vistas encantadoras e fazer fotos belíssimas.

Crucifixação


Uma visita ao Caraça será um daqueles momentos dos quais você jamais se esquecerá, pois a sensação de se estar em meio à floresta, vendo uma igreja neo-gótica, com vista para a Serra do Caraça, é indescritível. Somente pode ser experimentada pessoalmente. Desta forma, não hesite em planejar sua visita ao Santuário do Caraça.

Isolamento do Santuário
 

Para maiores informações, visite o site oficial do Santuário do Caraça

http://www.santuariodocaraca.com.br/

Marco André Briones – pensarnaoeproibidoainda@gmail.com

Todas as fotos da matéria foram tiradas por Marco André Briones, em dezembro de 2013.

Com agradecimentos especiais à Emiliana Fonseca

Bibliografia usada:

Caraça – Sua Igreja e outras construções – Padre José Tobias Zico C.M.

Caraça – Peregrinação, Cultura, Turismo – Padre José Tobias Zico C.M.

Santuário do Caraça, onde história e natureza andam juntas – Estado de São Paulo – 18/09/2018, - Bruna Tiussu.

Espaço Religioso e Espaço Turístico: Significações culturais e ambiguidades no Santuário do Caraça/MG – Denise Pereira e Alexandre de Pádua Carrieri.

Santuário do Caraça – Revista Sagarana.com.br – Cezar Felix