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quinta-feira, 21 de janeiro de 2021

AREIAS

 

AREIAS – INSPIRAÇÃO PARA MONTEIRO LOBATO

 

Foto de Marcio Masulino Alves


Situada a 250 km de São Paulo, ou 4 horas de viagem de carro, Areias é uma cidade que já foi um dos maiores polos cafeeiros do Brasil e que atualmente tem sua economia baseada na atividade pecuária.

Dizem que o nome da cidade se deve à um episódio ocorrido nos tempos do tropeirismo, quando tropeiros de Minas Gerais e de São Paulo , quando foram comer suas sobremesas depois de jantar, ao abrirem as caixetas onde guardavam suas goiabadas, encontraram apenas areia, pois as sobremesas haviam sido roubadas e, no lugar dela, alguém havia deixado apenas areia. A partir de então, sempre que se referiam ao tal rancho, diziam: “Lá no lugar das areias.”. Outros afirmam que o nome da cidade se dá pelo fato de seu solo ser particularmente arenoso.

Praça Nove de Julho


Presume-se que a chegada dos primeiros bandeirantes e desbravadores na região de Areias tenha ocorrido em 1748. O ponto inicial do desbravamento foi o povoado de Resende, que era chamado inicialmente de Campo Alegre. Desta forma, considera-se que os primeiros povoadores de Areias tenham sido os mesmos que fundaram Resende.

Originalmente um antigo pouso de tropas, à margem do Caminho Novo da Freguesia da Piedade, Areias foi um município pioneiro na produção e exportação de café, através do porto de Mambucaba, entre Paraty e Angra dos Reis.

O ciclo econômico do café durou de 1830 a 1910, durante o qual ocorreu seu apogeu. No entanto, Areias atingiu seu ápice na década de 1850-1860, quando a cidade prosperou por causa de suas grandes fazendas de café e com a construção de sua Igreja Matriz. Além disso, possuía muitos sobrados, ruas, jornais, um teatro, colégios particulares, bandas de música, fazendas de café, entre outros.

A Igreja Matriz de Areias, com suas duas torres é um testemunho da prosperidade e riqueza local, pois apenas as cidades muito ricas terminavam a construção de duas torres em suas igrejas, pois o Vaticano cobrava altos impostos das igrejas que haviam concluído suas torres. O sino da Igreja Matriz de Areias tocou em ocasiões especiais, como o término da Guerra do Paraguai, na Assinatura da Lei Áurea pela Princesa Isabel, no final da Guerra dos Canudos, na Revolução de 1932 e na Segunda Guerra Mundial.

Igreja Matriz


Areias foi um município com um grande território, do qual foram sucessivamente desmembrados os municípios de Cruzeiro, Queluz, Silveiras, Bananal e São José do Barreiro, todos municípios que fizeram parte do Circuito do Café.

Com o passar do tempo, Areias passou a ser também um núcleo produtor de arroz, feijão, mandioca e cana de açúcar, além da criação de galinhas.

Durante a Revolução de 1842, Areias teve todas as suas garantias constitucionais suspensas e foi anexada à Província do Rio de Janeiro, voltando a fazer parte de São Paulo apenas no ano seguinte, devido à sua oposição ao Império.

Com o declínio da atividade cafeeira e a abolição da escravatura, novas atividades econômicas, tais como pastagens, comércio e industrialização acabaram por substituir o café e foram empregadas como alternativas para a manutenção da atividade econômica da região. Os grandes fazendeiros da região tiveram suas fazendas hipotecadas e mudaram-se para outras partes do estado. Aqueles que ficaram, viram seus cafezais serem transformados em pastos para a pecuária.

O Vale do Paraíba, no qual se situa a cidade de Areias, foi a região que apresentou maior resistência quanto à abolição da escravatura, pois a economia local baseada na cultura cafeeira dependia fortemente da mão de obra escrava. Com o advento da abolição da escravatura, os negros liberados não ficaram na região. Partiram todos para o Rio de Janeiro, pois acreditavam que lá teriam a proteção da Princesa Isabel.

Além da Igreja Matriz, uma outra construção muito importante da cidade é o Solar do Capitão Mor, que foi o local onde se hospedou o Príncipe D. Pedro I, em agosto de 1822. D. Pedro I passou pela cidade em sua viagem para São Paulo, que culminou na Declaração da Independência do Brasil.  Em tal ocasião, pernoitou no Solar de Domingos Moreira da Silva.

A Velha Figueira é uma árvore que ficou muito conhecida na região pois sob sua sombra descansavam os tropeiros e transeuntes que circulavam pelo Caminho Novo da Piedade. Embaixo dela também descansou D. Pedro I, em sua viagem rumo à São Paulo em agosto de 1822. Atualmente existe uma placa comemorativa embaixo da Velha Figueira, celebrando a passagem do primeiro Imperador do Brasil pelo local.

Velha Figueira


No quarto que foi usado por D. Pedro I, no último andar do Solar do Capitão Mor, havia três janelas, cada uma voltada para uma direção diferente, que serviam como um posto de observação. A explicação para tal fato é que o capitão responsável pela expulsão dos últimos índios da região, proprietário do Solar, estava sempre preparado para um ataque indígena e fez de seu quarto, uma torre de vigia.

Eu tive a oportunidade de visitar o quarto no qual ficou hospedado D. Pedro I. Realmente a vista é privilegiada, pois cobre praticamente todos os ângulos da cidade. No entanto, me entristeceu o fato de que a decoração do quarto ter sido totalmente descaracterizada, não havendo absolutamente nenhum móvel remanescente da época. Atualmente, o quarto está decorado com móveis e objetos dos dias de hoje, não combinando com a atmosfera histórica do local.

Vista do Quadro de D.Pedro I


Em dezembro de 1868, ao voltarem de uma longa viagem pela Província de São Paulo, a Princesa Isabel e o Conde D’Eu hospedaram-se em Areias, no Solar da Família Pena.

Hoje em dia, o Solar do Capitão Mor foi transformado em um hotel, chamado Hotel Sant’Anna. O mesmo prédio foi usado para uma das últimas festas da monarquia, organizada pela Princesa Isabel para comemorar a abolição da escravatura. Infelizmente, mais uma vez, o salão no qual ocorreu tal importante festa hoje em dia é o restaurante e salão de café da manhã dos hóspedes, tendo também sido totalmente descaracterizado. O único vestígio remanescente dos tempos áureos do Solar é a existência de uma capelinha, anexa ao salão, existente até hoje, a qual eu também visitei.

Hotel Sant'Anna


Capela do Hotel Sant'Anna


O sobrado anexo ao hotel, é onde residiram Euclides da Cunha e Monteiro Lobato, outros personagens ilustres na história de Areias.

Euclides da Cunha construiu dois pontilhões de madeira na cidade: um sobre o ribeirão João Paulo, na estrada para São José do Barreiro, e outro sobre o córrego São Domingos, na estrada para Silveiras. Além disso, também projetou e orçou a reforma do prédio da Câmara de Vereadores e Cadeia Pública, que já foi usado como Bolsa de Valores, na qual era negociado todo o café da região.

Areias também é conhecida por ter sido a comarca na qual Monteiro Lobato começou sua vida profissional, como promotor público em 1907. Foi lá que ele escreveu suas primeiras obras, “Urupês” e “Cidades Mortas”, que hoje em dia são considerados clássicos da literatura brasileira. Areias foi usada como modelo para todas as “Cidades Mortas” descritas por Monteiro Lobato em seu renomado livro.

Coincidentemente, Monteiro Lobato ocupou o mesmo quarto em uma pensão que havia sido anteriormente ocupado por Euclides da Cunha.

Em 1950, a construção da nova Rodovia Presidente Dutra, distante 13 km do município, acentuou ainda mais a decadência da cidade, pois quase todo o tráfego que passava por ali acabou sendo desviado para a nova rodovia.

Areias é conhecida por seu clima ameno e prazeroso, sendo muito procurada por pessoas em busca de repouso e para o tratamento de várias doenças, pois a temperatura do local tem um clima tipicamente europeu. Suas águas são cristalinas e puras e seus campos não possuem carrapatos nem bernes. Suas maçãs, peras e pêssegos são renomados pela qualidade e sabor que apresentam.

Quem estiver percorrendo o “Roteiro do Café”, que também inclui as cidades de Silveiras, Bananal, São José do Barreiro e Queluz, não deve deixar de conhecer Areias, pois poderá completar o circuito e conhecer uma simpática cidade, que já serviu de inspiração para Monteiro Lobato.

Marco André Briones – pensarnaoeproibidoainda@gmail.com

Todas as fotos da matéria foram tiradas por Marco André Briones, em julho de 2018.

Bibliografia usada: Areias: Berço do Café no Vale do Paraíba Paulista, de Guido Gilberto do Nascimento